Mais de 300 famílias de vítimas da ditadura militar no Brasil devem receber, em maio, novas certidões de óbito que reconhecem oficialmente a morte por perseguição política. A medida atende a uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que busca uniformizar e atualizar esses registros com base em dados oficiais.
Novo processo
Segundo a CNN, com a aprovação da Resolução CNJ nº 452, em dezembro de 2023, cartórios de registro civil em todo o país, passaram a adotar um novo procedimento para retificação de certidões de óbito de mortos e desaparecidos políticos. A norma determina que os cartórios façam a retificação automática dos documentos com base nas informações da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), vinculada ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.
Essa mudança permite que as certidões incluam, entre outros dados, a causa da morte como sendo violenta e decorrente de perseguição política pelo Estado brasileiro. A medida elimina a necessidade de processos judiciais e visa agilizar o reconhecimento formal das vítimas.
No início de abril, o CNJ expediu 314 ofícios aos cartórios responsáveis pelos registros originais. Cada um desses ofícios já identifica os óbitos a serem retificados. Os cartórios terão até 30 dias para realizar a atualização e encaminhar os documentos corrigidos ao CNJ. Após revisão, os documentos serão impressos e entregues às famílias das vítimas em cerimônia oficial.
Conforme o juiz auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça, Fernando Cury, a iniciativa representa um esforço institucional para reparar omissões históricas e reduzir entraves burocráticos enfrentados pelas famílias.
Histórico do processo
Antes da atual resolução, a retificação de certidões de óbito exigia processo judicial. Até 2014, as famílias tinham que ingressar com ações específicas, geralmente com custo elevado e resultados incertos, o que dificultava o reconhecimento oficial das circunstâncias da morte.
Em 2014, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) divulgou um relatório com informações detalhadas sobre vítimas do regime militar, apontando responsabilidades e causas das mortes. No entanto, mesmo com o relatório, não havia um mecanismo automatizado para retificação dos documentos.
A primeira mudança significativa ocorreu em 2016, durante o governo Dilma Rousseff, com a publicação da Lei nº 13.261/2016, que permitiu retificações administrativas em cartório sem necessidade de decisão judicial, desde que houvesse documentação suficiente. Essa alteração, embora importante, ainda dependia da disposição dos cartórios e da apresentação de provas pelas famílias.
Post de ex-presidenta Dilma Rousseff comemorando a vitória de "Ainda Estou Aqui" no Oscar 2025 (Foto: reprodução/Instagram/@dilmarousseff)
Agora, com a resolução de 2023, esse processo torna-se centralizado e com base em documentos já reconhecidos pelo próprio Estado. A atualização das certidões é considerada um passo relevante no processo de reparação e reconhecimento histórico das violações ocorridas durante a ditadura.
Foto Destaque: Conselho Nacional de Justiça (Reprodução/Flickr/Rômulo Serpa/Agência CNJ)