Montadoras globais entram em alerta por falta de chips

À medida que a crise global de abastecimento de semicondutores se aprofunda, montadoras de automóveis estão revisitando estratégias, garantindo estoques e buscando alternativas de fornecimento para evitar paralisações. No foco está a fabricante de chips Nexperia e como sua situação desencadeou alarmes no setor automotivo.

O gatilho da crise

A Nexperia, empresa holandesa que opera fábricas em diversos países, está no centro de um impasse geopolítico. O governo holandês assumiu o controle operacional da Nexperia, citando riscos à segurança nacional por conta da sua controladora chinesa, Wingtech Technology. Em seguida, a China proibiu exportações de produtos da Nexperia a partir de seu território.

Esses movimentos geraram incerteza sobre o fornecimento de semicondutores, entregues em grande parte para a indústria automotiva, especialmente em peças eletrônicas que equipam veículos modernos.

Impacto para as montadoras

Alguns sinais de alerta já aparecem com clareza no setor automotivo. A Nissan Motor Corporation revelou que possui chips suficientes apenas até a primeira semana de novembro, o que acendeu um alerta interno e levou a empresa a buscar alternativas emergenciais de fornecimento.

Já a Honda Motor Co., Ltd. anunciou a suspensão temporária da produção em uma de suas fábricas no México e iniciou ajustes nas operações realizadas nos Estados Unidos e no Canadá, como forma de reduzir o impacto da escassez.

No Brasil, a preocupação também cresce. Um funcionário do governo brasileiro afirmou que algumas fábricas instaladas no país poderão ter que interromper suas atividades dentro de duas a três semanas, caso a crise de abastecimento se prolongue e não sejam encontradas soluções rápidas para reposição dos semicondutores.

Porque esse episódio é diferente dos outros

Executivos da indústria destacam que, embora já tenha havido escassez severa de chips na era da Covid-19, o contexto agora é diverso e mais complexo.


Impacto para montadoras (Vídeo: reprodução/YouTube/@CNNbrasil)


Ola Källenius, CEO da Mercedes‑Benz Group, afirmou que o problema “é evidente que estamos vasculhando o mundo em busca de alternativas” e que “esta situação é diferente da última crise dos chips, pois agora o problema tem raízes políticas”.

Outro executivo da Arthur D. Little, Klaus Schmitz, lembrou que, embora as montadoras tenham aprendido lições anteriores e mantido estoques, ainda dependem de muitos fornecedores menores e a visibilidade sobre a cadeia mais profunda está reduzida.

Consequências potenciais

Caso a cadeia de fornecimento de chips sofra cortes ou atrasos prolongados, a produção de veículos poderá ser diretamente afetada, com risco real de paralisações nas linhas de montagem. Esse impacto não atinge apenas as grandes montadoras, mas também uma ampla rede de fornecedores de peças e componentes, que dependem do fluxo contínuo de produção para manter suas operações.

Diante desse cenário, a tradicional lógica do “just-in-time”, modelo que prioriza estoques mínimos e entregas sob demanda, está sendo revista em diversas empresas do setor automotivo. Muitas montadoras passaram a reconhecer que, em tempos de instabilidade global, manter estoques reduzidos pode representar um risco maior do que o custo de armazenagem.

Para tentar driblar a crise, alguns fabricantes estão avaliando o uso de peças alternativas ou componentes de menor complexidade tecnológica, capazes de substituir temporariamente chips mais avançados que estão em falta. A estratégia busca manter a produção ativa, mesmo que isso implique ajustes em funcionalidades eletrônicas de certos modelos.

Sob uma perspectiva geopolítica, a situação também expõe a fragilidade das cadeias de suprimentos internacionais. Como destacou Ola Källenius, CEO da Mercedes-Benz Group, “você tem praticamente os cinco continentes dentro de um carro moderno de alta tecnologia”. A frase resume o desafio atual em um mundo altamente interconectado, qualquer ruptura regional pode gerar um efeito dominó com alcance global.

O futuro da cadeia de suprimentos automotiva

Diante da nova crise, especialistas defendem que a indústria avance em duas frentes, a diversificação de fornecedores e regionalização da produção de semicondutores. Nos últimos anos, União Europeia e Estados Unidos já anunciaram planos bilionários para incentivar fábricas locais de chips, buscando reduzir a dependência da Ásia.

No Brasil, projetos semelhantes ainda são tímidos. A antiga CEITEC, estatal voltada à fabricação de semicondutores em Porto Alegre, foi desativada em 2022 e ainda não há um substituto em operação. “A falta de uma política industrial consistente nos torna vulneráveis a crises externas”, afirma Paschoarelli.

Para Schmitz, da Arthur D. Little, o futuro dependerá da capacidade de adaptação das montadoras. “As empresas que conseguirem redesenhar suas cadeias de suprimento, mesmo que com custos iniciais mais altos, terão vantagem estratégica. As que não fizerem isso continuarão reféns das tensões internacionais.”

Essa escassez de chips volta a expor uma das maiores fragilidades da indústria moderna, a sua dependência de poucos polos produtivos e de estabilidade política internacional. Com veículos cada vez mais conectados, autônomos e eletrificados, a demanda por semicondutores só tende a crescer e qualquer ruptura na cadeia tem efeito cascata.

Embora o episódio atual ainda possa ser contornado com medidas emergenciais, o consenso é claro, que a indústria automotiva precisa repensar seu modelo global de fornecimento. O tempo, porém, está correndo e as montadoras sabem que, sem chips, a engrenagem vai parar.

Brasil e Argentina firmam acordo que facilita comércio automotivo

Segundo publicação desta terça-feira (17) no Diário Oficial da União, o ministro e vice-presidente do Brasil, Geraldo Alckmin, assinou um novo acordo que visa facilitar o trânsito de automóveis de até cinco toneladas e o comércio de peças automotivas entre o Brasil e Argentina, facilitando as transações entre os países.

Novo acordo

Além de facilitar o transporte de mercadorias entre os países, o acordo também prevê a eliminação de taxas nas importações de autopeças, porém as empresas que se beneficiarão do decreto precisarão investir 2% do valor das importações em projetos de pesquisas no setor automotivo. 


Indústria automotiva (Foto: reprodução/NurPhoto /Getty images embed)

“Além de melhorar as condições de acesso a mercados e desonerar a importação de autopeças não produzidas localmente, o 46º Protocolo Adicional atualiza a classificação dos produtos e aprimora os critérios sobre regras de origem, que determinam se um item é realmente fabricado em um dos dois países”, afirmou o ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) ao comentar o 46º Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Econômica (ACE) nº 14 firmado este ano entre os países.

Até o momento, o comércio entre Brasil e Argentina conta com uma alta de 26% no valor arrecadado, em comparação com os resultados de 2024.

Benefícios para o comércio brasileiro 

De acordo com o ministro Geraldo Alckmin, o acordo irá proporcionar diversas oportunidades de pesquisa e desenvolvimento do mercado automotivo brasileiro, que atualmente ocupa a oitava posição no ranking mundial. A cooperação entre Brasil e Argentina, que tem o setor automotivo como um dos principais pilares no relacionamento comercial e que gerou cerca de US$ 13,7 bilhões em 2024, reduzirá os custos e aumentará a competitividade da indústria brasileira. 

O novo decreto também buscou trazer clareza para as especificações do ACE nº 14, promovendo uma maior segurança jurídica e facilitando a classificação dos produtos. Os novos protocolos deixam em evidência as diversas iniciativas de investimentos no setor, como o Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover), que deve investir R$ 19,3 bilhões na indústria até 2028.