Ocorreu nesta quarta-feira (19) a suspensão do livro ‘O menino marrom’, do escritor Ziraldo, após a Secretaria Municipal de Educação de Conselheiro Lafaiete em Minas Gerais, vetar todas as atividades relacionadas ao livro, nas escolas da cidade, decorrente da pressão dos pais, que declaram o conteúdo do Livro “agressivo”.
O livro, lançado em 1986, relata e tem como foco a narração da vida de um menino negro e todas as suas vivências no mundo, através de mensagens que abordam a importância de aceitar as diferenças e que todos os indivíduos importam. Os pais relatam agressividade em determinados trechos, que induzem as crianças a “praticarem maldade”.
Trechos do livro
Os pais citam um trecho do livro que conta uma situação entre o personagem principal e o amigo, onde os meninos pensam em realizar um possível pacto de sangue, que não é realizado:
“Temos que fazer o pacto de sangue!”. Um dos meninos caminhou até a cozinha em busca de uma faca de ponta para furar os pulsos.
Em sequência, os personagens optam pelo uso de tinta azul ao invés de sangue.
"Ficaram os dois com as pontas do fura bolos cheias de tinta azul."
O outro trecho trata-se de um pensamento negativo do protagonista referente a uma senhorinha que não aceitou a ajuda que ele ofereceu para atravessar a rua. Essa ação também não ocorreu, por se tratar apenas de pensamentos.
O que diz a prefeitura de Conselheiro Lafaiete
A prefeitura publicou uma nota oficial nas redes sociais, onde mencionam a importância do livro de Ziraldo: "é um recurso valioso na educação, pois promove discussões importantes sobre respeito às diferenças e igualdade" e" aborda de forma sensível e poética temas como diversidade racial, preconceito e amizade".
Personagens do livro em ilustrações (Foto: reprodução/divulgação/O Globo)
Contudo, mesmo com as diversas manifestações e divergência de opiniões, a Secretaria de Educação decidiu realizar a suspensão do livro e qualquer atividade relacionada, a fim de readequar as atividades pedagógicas, com o intuito de evitar interpretações equivocadas.
Em nota, a prefeitura diz: "Lamentamos que tenham havido interpretações dúbias [...]. A Secretaria, em sua função de gestão e articulação entre escola e comunidade, compreende ser necessário momento de diálogo junto aos responsáveis para que não sejam estabelecidos pensamentos precipitados e depreciativos em relação às temáticas abordadas".
Reações
A decisão causou reações entre os pais dos alunos, professores das escolas municipais e pessoas que acompanham a prefeitura nas redes sociais.
Em comentário, o cartunista e especialista em literatura infantil José Carlos Aragão, diz que a suspensão do livro é uma forma de manifestação de censura.
O colunista afirma: “A literatura não pode ser tomada como um código de conduta, de moral e bons costumes. [...] A literatura é arte, uma coisa que vai muito além disso."
A professora de português Marta Glória Barbosa diz que a medida é desfavorável para os estudantes e se diz preocupada com a suspensão desse e qualquer livro: “Sou professora de português, então, qualquer retirada de livro, para mim, é o cúmulo do absurdo. O livro é espetacular, escrito pelo Ziraldo, que é nosso. Não vejo nenhuma justificativa para essa suspensão", disse a professora.
Nas redes sociais da prefeitura, outros comentários contra a medida foram escritos: ”Não dá pra acreditar que em 2024 estamos censurando Ziraldo. Esse país está perdido mesmo". Afirmou uma mulher que acompanha a prefeitura nas redes sociais
Ziraldo
Escritor, cartunista e jornalista brasileiro, Ziraldo (Foto: reprodução/divulgação/O globo)
Ziraldo Alves Pinto é o nome completo do renomado escritor, cartunista e jornalista brasileiro, popularmente conhecido apenas como Ziraldo. Autor de obras infantis de sucesso como “O Menino Maluquinho” e “O Menino Marrom”, ambas as criações trazem uma abordagem lúdica e educativa em prol da conscientização da diversidade já na infância. Além de escritor, Ziraldo também ilustrou obras importantes e contribuiu significativamente para a cultura e literatura brasileira.
Foto destaque: livro infantil do escritor e cartunista Ziraldo, “O Menino Marrom” (Reprodução/Divulgação/Fusne)