O cardeal italiano Giovanni Angelo Becciu desistiu oficialmente, nesta terça-feira (29), de participar do conclave para eleição do novo papa que terá início na noite de quarta-feira, 7 de maio. Foi o próprio sacerdote quem comunicou sobre sua decisão em uma declaração oficial, conforme matéria publicada pelo site Vatican News nesta terça. “Tendo em mente o bem da Igreja, que servi e continuarei a servir com fidelidade e amor, bem como contribuir à comunhão e à serenidade do Conclave, decidi obedecer, como sempre fiz, à vontade do Papa Francisco de não entrar em Conclave, permanecendo convencido de minha inocência”, justificou o cardeal.
Mesmo desprovido dos direitos do cardinalato, o religioso vinha causando polêmica por ter pressionado autoridades eclesiásticas do Vaticano para ser admitido na votação que definirá quem será o próximo católico a ocupar a cadeira que já foi do apóstolo Pedro — o primeiro discípulo a quem Jesus confiou à liderança e edificou sua Igreja, como conta a tradição apostólica e passagem da Bíblia Sagrada.
A reivindicação sobre ser inocente tem um porquê, e não é de hoje. Em dezembro de 2023, Giovanni Angelo foi condenado à prisão por crimes relacionados à negociação da compra de um imóvel na Inglaterra, mas nega ter cometido os delitos.
O cardeal Giovanni Angelo Becciu não participará do #Conclave para a eleição do novo Papa, que terá início na tarde de quarta-feira, 7 de maio. O cardeal italiano divulgou uma declaraçãohttps://t.co/H42j3wztCX pic.twitter.com/bDs0G1Lhph
— Vatican News (@vaticannews_pt) April 29, 2025
Publicação do Vatican News sobre a desistência do cardeal Giovanni Angelo (Foto: reprodução/X/@vaticannews_pt)
Entenda o caso
Os escândalos que surgiram por conta das acusações de crimes e pela sua má gestão ensejaram seu próprio pedido de renúncia ao cargo de Prefeito da Congregação para as Causas dos Santos e também de renúncia às suas prerrogativas relacionadas ao cardinalato, em setembro de 2020.
Como corolário da renúncia e por ordem do pontífice, foram vedadas sua participação em conclaves e as demais vantagens inerentes ao cargo de cardeal. Por isso, até finalmente o cardeal Giovanni declarar sua desistência, a controvérsia veio ganhando corpo quando ele insistiu em fazer parte do conclave logo às portas de o evento ocorrer em Roma.
No dia seguinte à morte do papa Francisco, desafiando o Vaticano, Giovanni Angelo anunciou que tinha ido a Roma para participar do conclave sob a alegação de que Francisco havia assegurado a ele que seus direitos ligados ao cardinalato permaneciam vitalícios.
Já o cardeal Pietro Parolin, secretário de Estado do Papa por anos, desmentiu a afirmação. Parolin entregou a Giovanni duas cartas oficiais assinadas pelo próprio Romano Pontífice, na qual ratifica que Giovanni não pode participar de conclaves.
Matéria da CNN sobre o cardeal que desistiu de participar o conclave (Vídeo: reprodução/X/CNNBrasil)
Motivo da renúncia
O cardeal Giovanni Angelo renunciou às prerrogativas do cardinalato, depois de ter se tornado alvo de investigação sobre irregularidades na aquisição de um prédio de luxo em Sloan Avenue, na capital inglesa, Londres. Na época, o papa Francisco tinha aceitado o afastamento do cardeal que também atuava como chefe de gabinete do santo padre.
Conforme publicado pela BBC, as investigações realizadas em 2014 deram conta de que o Vaticano havia gastado mais de US$ 200 milhões na compra do imóvel e que, parte do dinheiro utilizado deveria ter sido destinada a obras de caridade.
Acredita-se que Giovanni Angelo também tenha desviado recursos para a diocese de sua cidade de origem, a Sardenha, para beneficiar membros de sua própria família.
Pope Francis exchanging Christmas greetings with Giovanni Angelo Cardinal Becciu this morning. The Pope had stripped Becciu of the rights associated with the Cardinalature in September 2020 over allegations of financial corruption. pic.twitter.com/VslPaFB0BL
— Catholic Sat (@CatholicSat) December 22, 2022
Cardeais cumprimentam o Papa Francisco na época do Natal em dezembro de 2022 no Vaticano (Vídeo: reprodução/X/@CatholicSat)
Condenação
Em dois anos de julgamento, foram cerca de 86 audiências. O Tribunal do Vaticano condenou o religioso por peculato, fraude e abuso de poder em dezembro de 2023. O cardeal foi acusado de usar o fundo de doações de fiéis católicos para a compra de um prédio em Londres. Estima-se que o crime tenha causado um déficit orçamental de 139 milhões de euros nas finanças da Santa Sé.
Como pena, Giovanni Angelo Becciu pegou cinco anos e seis meses de prisão e foi multado em 8 mil euros. Sua sentença também incluiu a impossibilidade perpétua de ocupar cargos públicos.
Dada a gravidade do fato, o papa Francisco demitiu Becciu do cargo de Prefeito da Congregação para as Causas dos Santos e retirou dele o direito de participar de futuros conclaves.
O religioso reivindica inocência até hoje. Desde a sentença ele recorreu da decisão e continua em liberdade. O cardeal chegou a afirmar que Francisco havia perdido a fé nele.
O cardeal Giovanni Angelo Becciu (à esquerda na foto) conversa com o Papa Francisco (à direita) (Foto: reprodução/X/@panoramicaleu)
Quem é o Cardeal Giovanni Angelo
O italiano Giovanni Angelo Becciu nasceu em 1948, na Sardenha — uma grande ilha banhada pelo Mar Mediterrâneo no território da Itália.
Ordenado padre em 1972, o religioso teve uma extensa carreira diplomática. Foi núncio apostólico — representante papal que faz a diplomacia do Vaticano — em diversos países, tais como: República Centro-Africana, Sudão, Nova Zelândia, Libéria, Reino Unido, França e EUA.
Durante o papado de João Paulo II, o cardeal italiano, que completará 77 anos neste ano de 2025, atuou no cargo diplomático na Angola e em São Tomé e Príncipe. Já na era Bento XVI, foi designado a núncio em Cuba. Ele também foi subsecretário da Secretaria de Estado em 2011.
Considerado uma figura influente no Vaticano, em 2018, Giovanni foi nomeado cardeal pelo próprio papa Francisco. Um ano depois se tornou Prefeito da Congregação para as Causas dos Santos.
Cerimônia em que o Papa Francisco nomeou Giovanni Angelo Becciuda (em destaque no centro) ao posto de cardeal da Igreja em 2018 (Foto: reprodução/X/@ArgenPoirot)
Já na posição de conselheiro do romano pontífice, Giovanni Angelo chegou a ser apontado como seu possível sucessor. Contudo, após os escândalos relacionados à gestão financeira e a crimes terem vindo à tona, já que Giovanni foi julgado e condenado à prisão pelo Tribunal do Vaticano, então, o sacerdote perdeu espaço na Igreja.
Giovanni Angelo Becciu é considerado, até hoje, o funcionário de mais alta posição na hierarquia da Igreja Católica Apostólica Romana a ocupar uma cadeira de réu no Tribunal do Vaticano — a Justiça civil da Cidade-Estado.
Foto Destaque: o cardeal Giovanni Angelo Becciu (Reprodução/X/@monicafabiola91)