Neste sábado (24), o ministro da Advocacia-Geral da União, Jorge Messias, determinou uma investigação para que sejam identificadas as redes de desinformação sobre a Ilha de Marajó, no Pará. A decisão acontece após a repercussão massiva nas redes sociais de conteúdos denunciando supostos casos de exploração sexual infantil na região paraense.
Segundo o titular da AGU, a investigação será coordenada pela Procuradoria Nacional da União de Defesa da Democracia (PNDD). "Determinei à PNDD que atue imediatamente na identificação de redes de desinformação, que criam desordem informacional sobre a Ilha de Marajó. Os marajoaras merecem respeito e um tratamento digno de todo o Poder Público", escreveu Messias em seu perfil na rede social X, antigo Twitter.
O ministro também frisou o compromisso e empenho do governo federal em apurar as denúncias sérias sobre redes de exploração sexual e infantil em todo o país. “Protejamos as nossas crianças sem a propulsão de notícias falsas!", defendeu.
O ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, responsável pela solicitação de apuração à AGU, endossou o comentário de Messias, reforçando que não será permitida a difamação de uma região com intuitos políticos e financeiros: "não vamos permitir a difamação de uma região por oportunistas que se valem de um grave problema nacional como o da proteção de crianças e adolescentes para alavancar interesses políticos ou financeiros”, escreveu Silvio.
Artistas e influenciadores compartilharam conteúdo sobre a Ilha
Localizada no Norte do estado do Pará, a Ilha de Marajó, conhecida como a maior ilha fluviomarítima do mundo, ganhou repercussão após a cantora gospel Aymeê viralizar nas redes sociais em uma apresentação musical na qual fez referência aos casos de exploração sexual e infantil na ilha. Em um trecho da música autoral, Aymeê canta “enquanto isso no Marajó, o João desapareceu”.
Ao finalizar a apresentação, feita durante a semifinal de um programa de calouros, a cantora paraense fez um relato aos jurados: “Marajó é uma ilha a alguns minutos de Belém, minha terra. E lá tem muito tráfico de órgãos. Lá é normal isso. Tem pedofilia em nível hard. Marajó é muito turístico, e as famílias lá são muito carentes. As criancinhas de seis e sete anos saem numa canoa e se prostituem no barco por R$ 5”, disse a artista.
Aymeê viralizou nas redes após apresentação e já soma mais de um milhão de seguidores (Foto: reprodução/CNN Brasil/Yotube)
Ao longo da última semana, as redes sociais foram tomadas por publicações que citavam o suposto aumento da violência e da exploração infantil da região. Dezenas de artistas e influenciadores compartilharam imagens e informações sobre o caso, em uma espécie de revolta simultânea aparentemente orgânica. Dentre eles, Rafa Kaliman, Juliette, Angélica, Carlinhos Maia e Luísa Sonza.
Por outro lado, ONGs que atuam na região se pronunciaram criticando a forma como as notícias foram veiculadas e desmentindo informações ao enfatizar que associar o Marajó à exploração e o abuso sexual é uma forma de desonrar o povo marajoara. “A propaganda que associa o Marajó à exploração e o abuso sexual não é verdadeira: a população marajoara não normaliza violências contra crianças e adolescentes.”, escreveu, em nota, o Observatório de Marajó.
O Observatório também falou sobre recursos milionários que foram prometidos pela ex-ministra Damares Alves para fortalecer as comunidades escolares da região, mas que nunca foram destinados. “Ao invés disso, [Damares Alves] atentou contra a honra da população diversas vezes, espalhando mentiras, e abriu tais políticas públicas para grupos privados de São Paulo que defendem a privatização da educação pública", prosseguiu
A Cooperação da Juventude Amazônida para o Desenvolvimento Sustentável (Cojovem), por sua vez, disse: “não precisamos de um olhar estigmatizado e cheio de preconceito. O Marajó é símbolo de resistência, encanto e cultura da Amazônia".
Publicações com conteúdo falso
Uma das imagens amplamente compartilhadas em montagens sobre o caso de exploração sexual e infantil na ilha mostra crianças sendo transportadas em um carro. A imagem em questão, no entanto, foi utilizada fora do contexto original.
O caso refere-se a uma situação que ocorreu, na verdade, no Uzbequistão, em setembro de 2023, quando uma professora foi presa ao transportar irregularmente 25 crianças em um carro. Na época, o caso foi noticiado por diversos veículos de comunicação, como o Globo.
Imagem utilizada nas publicações não tem relação com tráfico humano (Foto: reprodução/Jornal Opção)
Em 2022, a população de Marajó já tinha sido alvo de fake News em falas da ex-ministra Damares Alves. Na ocasião, a parlamentar afirmou que crianças marajoaras tinham dentes arrancados para facilitar a prática de sexo oral. As declarações nunca foram comprovadas e o MPF pediu a indenização de R$ 5 milhões a Damares pelos danos sociais e morais causados à população da ilha.
Foto destaque: município da Ilha de Marajó (Reprodução/Ueslei Marcelino/Reuters)