Teoricamente, a legislação brasileira permite o aborto em casos de gravidez provenientes de um estupro desde 1940. Entretanto, as vítimas dessa violência enfrentam um verdadeiro dilema para garantir na prática o que já é previsto em lei.
Recentemente, o caso da menina de 11 anos, que foi violentada e conseguiu realizar o procedimento após a repercussão do caso, trouxe a tona o quanto a vítima de violência sexual é submetida a uma série de violências após o crime. Seja para denunciar ou para realizar um aborto seguro, muita vezes a vítima é desencorajada, tornando o processo muito mais doloroso.
Um estudo da Universidade Federal do Rio de Janeiro, realizado em 2020 e atualizado no ano de 2021, traz informações sobre como agem os hospitais públicos cadastrados pelo Ministério da Saúde para realizar o procedimento de aborto em casos de vítima de estupro.
O agendamento para realizar o procedimento de interrupção da gravidez é feito através de ligações telefônicas. As chamadas eram atendidas pelos profissionais da saúde de forma não acolhedora, segundo os autores do estudo. Essa conduta além de desencorajar as vítimas, dificulta o acesso a um direito previsto em lei em casos de estupro.
Vale ressaltar que quanto mais o tempo passa se tratando de uma gestação, mais difícil é para realizar o aborto e consequentemente mais riscos para a gestante. Entretanto, a lei brasileira não possui tempo máximo estipulado para a realização da interrupção.
A pesquisa cita também que falta preparo dos hospitais para fornecer informações sobre o aborto legal. A desinformação pode estender o processo que a princípio deveria ser curto para não estender mais o sofrimento da vítima de estupro que não deseja dar continuidade a gravidez indesejada.
A legislação prevê as vítimas de estupro atendimento gratuito no SUS, recebimento de tratamento contra as doenças sexualmente transmissíveis, pílula do dia seguinte, apoio psicológico e direito ao aberto legal (em casos de gravidez e caso a vítima opte por realizar o procedimento).
Livro da jornalista Ana Paula Araújo que traz casos reais de estupro e a peregrinação enfrentada por vítimas em busca de seus direitos (Foto: Reprodução/ QUEM)
O trabalho foi desenvolvido por mulheres, as pesquisadoras Eliane Vieira Lacerda Almeida, Lara Ribeiro Pereira Carneiro, Lorenna Medeiros Toscano de Brito, e Maria Inês Lopa Ruivo, sob a orientação da professora Érica Maia Arruda, do Grupo de Pesquisa Direitos Humanos e Transformação Social da Unirio nomearam o estudo como: "Não posso passar essa informação': O direito ao aborto legal no Brasil".
Foto destaque: Aborto legal. Reprodução/BBC.