Meninos Rei transforma a passarela em terreiro de celebração e futuro
Meninos Rei celebra 10 anos no SPFW com desfile que une ancestralidade, moda afro-baiana e criatividade autoral, transformando a passarela em ritual

O som do adjá abriu o desfile da Meninos Rei no São Paulo Fashion Week N60 como quem chama memórias antigas para dançar. À frente da passarela, Majur recebeu o instrumento sagrado das mãos da Mestra Zélia do Prato, e nesse gesto, o tempo pareceu se curvar diante da história. A cena, carregada de simbologia e emoção, resumiu o espírito de uma apresentação que ultrapassou o campo da moda: foi rito, homenagem e reencontro com as raízes.
Com o olhar voltado para o Recôncavo Baiano, os irmãos Céu e Júnior Rocha celebraram uma década de Meninos Rei transformando o concreto da Bienal em terreiro. Cada passo soava como um tambor, cada estampa como um canto de memória. O desfile marcou não apenas os 10 anos de uma marca, mas também a consolidação de uma estética afro-baiana que se recusa a ser tendência passageira porque nasce da fé, da cultura e da permanência.
O Recôncavo em movimento
Fundada em Salvador pelos irmãos Céu e Júnior Rocha, a Meninos Rei celebra uma década reafirmando o orgulho de vestir corpos negros e plurais. O desfile, batizado de “Orí”, resgatou a potência do Recôncavo Baiano em estampas vibrantes, alfaiataria fluida e referências ao candomblé, transformando a Bienal em território de memória e pertencimento.
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Coleção Meninos Rei no São Paulo Fashion Week 2026 (Vídeo: reprodução/ Instagram/ @spfw)
Estampas vibrantes e tecidos lisos dialogam com as silhuetas inspiradas nas indumentárias do candomblé, nas festas populares e na religiosidade que molda o cotidiano. A cada look, o público era convidado a atravessar oceanos simbólicos, entre a força de Iemanjá, representada por Luedji Luna, e a delicadeza das sambadeiras, que ocuparam a passarela com a dignidade de quem carrega gerações nos ombros.
O desfile também reafirmou o compromisso da marca com a representatividade. Na passarela, mulheres negras de diferentes idades e trajetórias dividiram o mesmo espaço, unidas pelo ritmo dos atabaques e pela estética afro-baiana que se tornou assinatura da Meninos Rei.
Criar, celebrar e também prosperar
Em entrevista nos bastidores, Júnior Rocha resumiu o novo momento da marca: “A moda precisa virar negócio”. A frase, dita com serenidade, traduz uma virada importante. Depois de uma década de afirmação criativa, a Meninos Rei busca também sustentabilidade financeira, sem perder a alma.
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Desfile Meninos Rei (Vídeo: reprodução/ Instagram/ @meninosrei)
As peças continuam autorais, feitas com algodão e adornadas por acessórios produzidos por artesãs de Maragogipinho, o maior polo ceramista da América Latina. Tops moldados em barro, brincos em forma de moringas e bolsas que evocam o baiacu revelam a potência do feito à mão.
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Momentos do desfile da Meninos Rei (Vídeo: reprodução/ Instagram/ @meninosrei)
Entre o sagrado e o comercial, Céu e Júnior Rocha reafirmam que moda é sobre ocupar espaços que antes lhes foram negados, contar histórias que insistem em sobreviver e resistir com a beleza como forma de poder. A cada costura, a Meninos Rei borda uma narrativa coletiva de quem transforma fé em estética, território em identidade e criação em caminho.
Em tempos de pressa e descartabilidade, a marca mostra que tradição não é sinônimo de passado, mas de permanência. Suas peças traduzem o encontro entre memória e invenção, provando que a moda pode, sim, ser um gesto de futuro — um futuro possível, plural e profundamente brasileiro.