A ideia de levar a humanidade até Marte e eventualmente colonizar o árido planeta vermelho já é antiga, mas esse possível segundo lar para a nossa espécie ainda está repleto de mistérios que os cientistas não conseguiram solucionar com o escopo da tecnologia e do investimento atual. Dentre esses mistérios e curiosidades, uma equipe de pesquisadores da Nasa recentemente descobriu — através dos dados enviados pelo extinto InSight Mars Lander, cuja missão concluiu em dezembro do ano passado — que a taxa de rotação de Marte, responsável por determinar o giro que o planeta dá em volta de seu próprio eixo, está acelerando gradualmente.
A missão, que durou cerca de quatro anos, permitiu que a Nasa usasse sua Deep Space Network, que é basicamente uma rede de antenas internacionais criadas com o intuito de facilitar a comunicação e o monitoramento de naves no espaço, para rastrear os movimentos do lander InSight conforme ele se movia junto do planeta. Ao transmitir sinais de rádio da Terra ao módulo de aterrissagem em Marte, a equipe de pesquisadores mediu as alterações nos sinais de retorno refletidos por ele. Essas medições permitiram que os cientistas pudessem determinar, através de cálculos, a velocidade na qual Marte está girando.
Tais medições são cerca de cinco vezes mais precisas do que as feitas através dos dados enviados pelas sondas Viking Mars da Nasa na década de 70. Graças a isso, os pesquisadores conseguiram descobrir que a rotação de Marte está acelerando alguns centímetros todo ano, antes do lander Insight ficar sem energia no fim do ano passado. Mais precisamente, o Experimento de Rotação e Estrutura Interior da InSight (RISE) determinou que a rotação do planeta está acelerando em cerca de 4 miliarcosegundos todo ano. Segundo a agência, isso significa que a duração do dia marciano diminui em uma fração de milissegundo por ano.
Uma descrição mais detalhada do estudo feito pelos pesquisadores foi publicada em um artigo na revista Nature.
A razão por trás da rotação acelerada
De acordo com os pesquisadores, há três motivos principais que podem estar causando essa aceleração:
- Movimentos já de longo prazo no material presente dentro do planeta e em seu núcleo;
- Uma tendência de longo prazo que se dá por conta de sua circulação atmosférica, provocada pela força rotacional no planeta;
- Um acúmulo de gelo nas calotas polares durante um longo período de tempo, ou uma recuperação pós-glacial, que faz com que as massas de terra do planeta subam depois de serem enterradas por camadas de gelo. Segundo a Nasa, uma alteração na massa do planeta pode fazer com que ele apresente um pequeno grau de aceleração.
Marte não está apenas acelerando
Através dos dados fornecidos pelo RISE, os pesquisadores também mediram a oscilação de Marte, causada pelo derramamento em seu núcleo líquido. Surpreendendo a equipe, o núcleo do planeta vermelho é maior do que o esperado, tendo cerca de 150km de diâmetro. Ao contrário do que se acreditava anteriormente, o núcleo de Marte é menos denso, contendo muito menos ferro em sua composição, bem como quase até 20% mais de enxofre. E, sendo líquido, ele tem uma capacidade de movimento própria e independente da casca rochosa externa de Marte. Esse movimento no núcleo interno causa oscilações periódicas no planeta.
Ilustração do lander InSight sobre solo marciano (Foto: Reprodução/Nasa)
Tanto a Terra quanto Marte são dotados de um núcleo rico em ferro, mas o planeta vermelho tem uma quantidade de elementos leves mais de duas vezes maior, informou a equipe. Não apenas isso, pois a quantidade de enxofre no núcleo do planeta também é dez vez maior do que o da Terra.
Marte não tem um campo magnético atualmente, mas a ciência já determinou que o planeta já teve um campo magnético em algum ponto de seu passado geológico. O enxofre no núcleo do planeta, segundo Bruce Banerdt — principal investigador da InSight —, provavelmente permitiu que o núcleo permanecesse líquido e suportasse um campo magnético.
Os dados obtidos pelo lander InSight são inestimáveis para a continuidade das pesquisas sobre Marte, já que pela primeira vez temos um mapa do interior do planeta. Agora sabemos a espessura da crosta, o tamanho do núcleo e os detalhes de sua composição. Isso permitirá que os cientistas possam comparar Marte com outros planetas no futuro, segundo Banerdt. E, mais importante ainda, nos permite estudar o passado e o presente de Marte ao longo dos últimos quatro bilhões de anos.
Foto destaque: Ilustração do solo marciano. Reprodução/Shutterstock & Jurik Peter