No dia 14 de março de 2018, a vereadora Marielle Franco e o seu motorista, Anderson Gomes, foram brutalmente assassinados, deixando uma grande ausência para os seus, além da perda irreparável para todos os brasileiros que lutam pela reconstrução de um país mais justo, e que almejam acabar com a desigualdade social.
Nesta data, em 2024, são seis anos desta lamentável ausência, e ainda não se sabe quem mandou matar Marielle, e o motivo.
O que Marielle e Anderson perderam nesses seis anos de suas vidas interrompidas
Morta aos 38 anos, Marielle não teve a oportunidade de vivenciar a experiência de ver a filha, Luyara, preparar-se para a formatura que ocorre neste ano; não conheceu a sobrinha mais nova, Eloah, filha de Anielle Franco, que nasceu em julho de 2020; não presenciou a irmã se tornar ministra em janeiro de 2023; não pôde comemorar a cura da mãe, Marinete, que foi diagnosticada com câncer de mama, além de ter sido impossibilitada de dar continuidade a um projeto familiar, que vinha sendo construído ao lado da esposa, Mônica Benício.
Anderson Gomes não pôde acompanhar as fases de crescimento do filho, Arthur, tampouco, teve conhecimento da doença rara dele, uma malformação congênita de parede abdominal, conhecida como onfalocele, sendo diagnosticado em 2018. O motorista também não presenciou a entrega das chaves da primeira casa própria, em outubro de 2023, um objetivo que ele vinha construindo com a mulher, Agatha Arnaus.
Em uma entrevista concedida ao g1, a viúva de Marielle, conta sobre o como tem sido difícil mensurar e externalizar o que deixou de ser vivido por elas, enquanto família.
“A gente demorou muitos anos para conseguir consolidar a nossa história como um núcleo familiar. E em 2017 e 2018 a gente estava, sem dúvida nenhuma, no momento mais feliz da nossa vida enquanto casal, enquanto mulheres que estavam ali se realizando. Tínhamos sonhos comuns que estávamos planejando para a festa de casamento", lamenta.
Para além da perda de Marielle como esposa, companheira e melhor amiga, Mônica menciona a morte prematura da vereadora como uma ausência de promessa para o futuro.
"Ele me tira a minha idealização de um projeto de família que estava sendo construído, sonhado como aquela mulher e que tinha sido fruto de um amor de muitos anos, que teve muitos contratempos para conseguir se consolidar, se concretizar", completa.
Para Agatha Arnaus, viúva de Anderson Gomes, o motorista era sinônimo de uma base para seguir seus sonhos construídos em família.
"Perdemos quase tudo. O próprio Anderson, a vida que a gente planejava. Arthur perdeu a possibilidade de jogar bola com o pai. Perdeu as brincadeiras com o Arthur. Ele perdeu os dias dos pais na escola; todos os eventos que existem. Natal, Ano Novo, nada mais. Perdeu muito nesse sentido. (Ele) Era louco para ser pai. Ele brincava (com as crianças) antes de a gente ter filho”, comentou.
A morte de Anderson impossibilita o pequeno Arthur de estar crescendo na companhia de um ser humano incrível, um pai maravilhoso, e que deixou para o menino, o legado do fascínio por carros, completou Agatha.
A mãe de Marielle Franco, Marinete da Silva, conta sobre a filha ter perdido momentos em família, como o nascimento da sobrinha Eloah, além de ter mencionado sobre o avanço que vem acontecendo nos âmbitos políticos, mediante as pautas, que inclusive sempre foram defendidas por Marielle, que é, sem dúvidas, sinônimo de luta, e vinha contribuindo para a reconstrução do país.
“Quando você perde uma mulher com 38 anos, com toda a vitalidade que Marielle tinha, perde parte da história”, enfatiza.
A respeito do tratamento contra o câncer, Marinete conta sobre o quando sentiu a falta da filha, que era cinco anos mais velha do que Anielle, e sempre esteve muito presente, com todos os cuidados necessários à família, não podendo deixar de falar sobre a sua contribuição na luta pela saúde de qualidade a todas as mulheres.
"Ela perdeu a Lyuara se formando agora em educação física. A Anielle virou ministra. A Mariah (sobrinha mais velha), que era o sonho dela (Marielle) entrar no Pedro II, conseguiu uma vaga. Veio a segunda filha da Anielle. Marielle perdeu a transformação do Brasil. As mudanças na política", comentou a mãe.
Antônio Francisco da Silva Neto, o pai de Marielle, além de também falar sobre as perdas da filha em momentos importante da família, contou sobre a falta que ela faz, ao acompanhá-lo em jogos do Flamengo, o que era um evento de grande importância para eles.
Luyara Santos, a filha deixada por Marielle, lamenta sobre o quanto é difícil seguir a vida sem os conselhos e o incentivo, que nunca faltaram por parte da mãe, e da saudade imensurável de momentos específicos que elas costumavam vivenciar, procurando recorrer aos seus lugares favoritos como uma forma de refúgio, sempre que esse sentimento aperta.
“São 6 dias das mães sem ela”, Luyara fala ainda, sobre a sensação de anos longos e dolorosos, relatando sobre ainda não ter tido o tempo necessário para viver o luto.
“Nem as próprias pessoas que mataram a minha mãe tinham a noção do que ela era e do que ia se tornar mundialmente. Eu ainda não tive muito tempo para ter o luto que eu precisava sentir. É sentir o luto da Marielle Francisco. As pessoas falam da Marielle Franco, mas eu sou filha da Marielle Francisco. O luto da menina de 19 anos que perdeu a mãe assassinada e o luto da filha da vereadora. Ela não viu a minha formatura, ela não viu a volta da minha tia formada dos Estados Unidos", complementa.
Para a irmã, Anielle Franco, a perda da irmã trouxe o vazio de sua ausência na participação do nascimento de sua segunda filha, que segundo Anielle, é extremamente semelhante a ela.
Deixou de participar de sua defesa de mestrado, das participações de aulas no colégio Dom Pedro II, que ela sempre sonhou que a sobrinha estudasse, além de ter perdido a oportunidade de presenciá-la como ministra, e provavelmente deixando de ser eleita como governadora ou senadora do Rio de Janeiro.
“Para mim, tem esses dois lados. A mesma coisa, se perguntar para a família do Anderson, eles vão dizer que ele deixou de acompanhar o crescimento do filho. Era a grande paixão dele. Mas, tenho certeza de que de onde eles estejam eles nos acompanham", disse ainda, Anielle, sobre o assassinato de Marielle e Anderson.
Quem mandou matar Marielle, e por quê?
Durante os primeiros cinco anos depois dos assassinatos, a Polícia Civil teve cinco delegados sob a responsabilidade pelos ocorrido na Delegacia de Homicídios, contando com a atuação de três equipes no Ministério Público Estadual. Suspeitas de obstrução durante as apurações foram levantadas, devido às trocas recorrentes de comando, o que foi alvo de críticas por familiares e movimentos sociais.
A Polícia Federal apontou em maio de 2019, que foram prestados depoimentos falsos, com a finalidade de dificultar a investigação dos homicídios. O caso foi abandonado em julho de 2021, afirmando que houve intervenções durante a apuração. Em fevereiro do ano passado, a apuração do caso, assim como a tentativa de homicídio contra a assessora Fernanda Chaves, passou a ser deresponsabilidade da Polícia Federal.
Marielle Franco (Foto: reprodução/Brasil de Fato)
O Ministério Público do Rio de Janeiro apontou que, entre as maiores dificuldades para que os mandantes sejam encontrados, é que os assassinos são componentes das forças policiais, portanto, têm conhecimento sobre como é realizada uma investigação, no entanto, afirma o comprometimento na consolidação de um trabalho técnico para que todos os envolvidos sejam identificados.
Até o momento, quatro indivíduos foram presos pela participação no assassinato, bem como, na tentativa de interferir nas investigações.
Foto destaque: Marielle Franco e Anderson Gomes (reprodução/CC-BY-SA/Esquerda Diário)