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[Crítica] “Os Segredos do Universo por Aristóteles e Dante” é mais potente e encantador que se imagina

Baseado no best-seller mundial de Benjamin Alire Sáenz, "Os Segredos do Universo por Aristóteles e Dante" chega ao cinemas brasileiros nesta quinta-feira (30); confira nossa crítica

29 Nov 2023 - 07h30 | Atualizado em 29 Nov 2023 - 07h30
[Crítica] “Os Segredos do Universo por Aristóteles e Dante” é mais potente e encantador que se imagina Lorena Bueri

“Aposto que você pode, por vezes, encontrar todos os mistérios do universo na mão de alguém.” - Benjamin Alire Sáenz

Baseado no best-seller mundial “Aristóteles e Dante Descobrem os Segredos do Universo”, de Benjamin Alire Sáenz, o longa “Os Segredos do Universo por Aristóteles e Dante” chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (30), carregando questões e discursos mais potentes que se poderia imaginar. O filme de Aitch Alberto, protagonizado pelos jovens Max Pelayo (Aristóteles) e Reese Gonzales (Dante) é uma grata surpresa ao cinema, capaz de trazer ao clichê um tom muito mais terno, sólido e surpreendentemente necessário. Com o longa singelo, Alberto vence uma das grandes barreiras do audiovisual, a de adaptar uma obra literária, com a maestria que mora nas entrelinhas ricas do filme.


Assista ao trailer de "Os Segredos do Universo por Aristóteles e Dante”  (Reprodução/YouTube/Fãs de Cinema)


Trama de “Os Segredos do Universo” 

A trama é ambientada no verão de 1987, em El Paso, Texas, nos Estados Unidos. Aristóteles Mendonza, um jovem mexicano-americano introvertido e solitário, de 15 anos, vive com seu pai e sua mãe, em uma casa em que não há muito diálogo, principalmente sobre o irmão mais velho, que estava na prisão. Seu pai serviu na Guerra do Vietnã e também se recusa a compartilhar as experiências vividas. As duas irmãs mais velhas já não moravam mais com eles. 

Em um dia qualquer, entediado e sem ter muito o que fazer, decide finalmente aprender a nadar e vai ao clube, onde conhece Dante Quintana, que se oferece para ensiná-lo. A coincidência dos nomes acaba os unindo em uma amizade que se torna cada vez mais forte e evidencia as diferenças entre os dois. Dante, também de família (metade) mexicana, era o oposto de Ari. Extrovertido, autoconfiante e parte de uma família de mente e diálogo abertos, ele era todo o livro aberto que Ari sonhava em ser. 


Cena de "Os Segredos do Universo por Aristóteles e Dante" (Divulgação/Sinny Assessoria/Imagem Filmes)


Ao mesmo tempo em que lidam com a descoberta e compreensão de suas identidades sexuais e raciais, os protagonistas, interpretados com brilhantismo por Pelayo e Gonzales, enfrentam o aflorar da adolescência no momento efervescente da década de 80, as diferenças entre si, a distância e as mudanças internas, fatores cruciais para o bom desenvolvimento do longa. 

Corajoso e ousado, o longa foge do clichê e aposta na profundidade e camadas da natureza humana

Como fugir do clichê em um romance adolescente? Aitch sabe a resposta: apostar na profundidade e na natureza dualista do ser humano e deixar com que as entrelinhas digam o que as palavras, por vezes, não conseguem abarcar. Alberto tinha em suas mãos a linha tênue entre personagens caricatos baseados em traços de personalidade queer e meninos realistas que expusessem as dificuldades de uma descoberta sexual desconfortável e turbulenta, em meio à homofobia visceral dos anos 80. As escolhas de direção e roteiro tendem para a segunda opção, por sorte do espectador. 

Max deposita em Aristóteles camadas suficientes para esquivar da redundância vazia do estereótipo “rapaz mal-humorado”. O jovem complexo tem pitadas de humor ácido, mistério intrínseco, uma terna gentileza e uma força inesperada. O arco dramático surpreendente do personagem deve-se muito, sim, ao roteiro e direção, mas enorme parcela deve ser colocada nas costas do ator, que assume com competência a missão de torná-lo mais realista e humano possível, equilibrando a sombra e a luz que todo bom personagem deve ter para não se tornar uma caricatura. Aristóteles passa por um amadurecimento tão real e convincente que emociona o público, ao sermos colocados nos mais íntimos de seus pensamentos. 


Max Pelayo como Aristóteles Mendonza (Divulgação/Sinny Assessoria/Imagem Filmes)


O longa também tem seu triunfo ao lidar com questões extremamente fortes de maneira delicada e terna, deixando, por vezes, que o silêncio do não dito faça o trabalho de resposta. Essa foi, para mim, a grande surpresa de “Os Segredos do Universo”, a potência de seus discursos e a necessidade de dizê-los (ou subentendê-los). 

Neste arco, a atuação do elenco de apoio, sobretudo dos pais de Ari (Veronica Falcon e Eugenio Derbez), torna-se uma jóia que é lapidada com a constância da performance do protagonista. A família Mendonza é a responsável por boa parte da profundidade do filme. Nela mora a dualidade do grande e duro silêncio e a força da fala que toca justamente onde deveria. Tornam-se a angústia e alívio de uma só vez. 

Porém, Dante acaba por se tornar uma peça solta em sua própria história de amor 

Em contraponto, temos um Dante se tornando distante. Apesar de compreensível o maior foco em Ari, a ausência de Dante, permeada pelo descobrimento da sexualidade e revelações feitas em cartas, acaba por afastá-lo. Tanto do público, quanto da conexão com a trama. Por vezes, a resolução pacífica de suas questões internas narradas em off se torna um pouco irreal e distante, embora seja um contraponto proposital ao turbilhão de mudanças dolorosas que Aristóteles passa no ano em que estiveram longe. Tal afastamento se torna prejudicial quando queríamos ver verdadeiramente mais do Dante de Reese, que acaba, nesse congelamento, se tornando uma peça solta em sua própria história de amor.


Reese Gonzales como Dante Quintana (Divulgação/Sinny Assessoria/Imagem Filmes)


Mas, o filme consegue manter o bom andamento ao trazê-lo de volta à tela para os últimos e importantes atos, além de reforçar a química mágica entre os atores. Mágica, essa é a palavra que melhor define o longa em sua totalidade, e mesmo este aspecto não é capaz de diminuir a experiência surpreendente e imersiva que proporciona ao espectador. 

Em conclusão, “Os Segredos do Universo” é uma história de amadurecimento que merece a atenção do público

“A todos os garotos que tiveram que aprender a jogar com regras diferentes”. - Benjamin Alire Sáenz

“Os Segredos do Universo por Aristóteles e Dante” é uma surpresa grata em 2023, ano marcado por produções LGBT+ de alta qualidade. Vai além de um romance teen ao abordar assuntos que precisam ser revistos, e ditos. É uma história de amadurecimento necessária, terna, mágica e encantadora, marcada por atuações potentes. E apesar da derrapada, que poderia ser solucionada com mais presença de Dante, tem um saldo positivo e satisfatório, sendo bem mais profundo e significativo do que se poderia imaginar.  

 

Nota: ★★★★

Foto destaque: Dante e Aristóteles (Divulgação/Sinny Assessoria/Imagem Filmes)

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