Alfaiataria e upcycling: cinco marcas que se destacam em Copenhague

CPHFW encerra sua semana de moda com desfiles autorais, novos talentos e forte presença feminina que renova os rumos da indústria

08 ago, 2025
Da alfaiataria desconstruída ao artesanato de impacto, os desfiles em Copenhague 2025 revelam uma moda que reflete tempo, corpo e identidade |  Foto: reprodução/ Instagram /@baumundpferdgarten/@gestuz/ @mkdtstudio
Da alfaiataria desconstruída ao artesanato de impacto, os desfiles em Copenhague 2025 revelam uma moda que reflete tempo, corpo e identidade | Foto: reprodução/ Instagram /@baumundpferdgarten/@gestuz/ @mkdtstudio

A moda escandinava mantém um ritmo próprio, marcado por sutilezas e camadas de interpretação. Em Copenhague, nada é revelado de imediato. Pelo contrário: a cidade exige tempo e atenção, convidando o olhar a permanecer para captar detalhes, perceber os ruídos entre as roupas e o corpo, o corte e o gesto.

Nesta temporada, o que se viu nas passarelas foi menos sobre impacto imediato e mais sobre permanência. Algumas marcas conseguiram traduzir esse espírito com profundidade — seja pela forma como lidam com o tempo, com o tecido ou com o próprio ato de criar.

MKDT Studio: estrutura limpa, respiração ampla

Logo nos primeiros minutos de desfile, o MKDT Studio deu o tom: uma alfaiataria que não precisa provar nada a ninguém. A marca, comandada por Mai-Britt Kristensen e Dekova Julie, sabe exatamente onde pisa — e, por isso mesmo, consegue fazer o que quer com o próprio molde.

As peças chegam como promessas não cumpridas — o blazer que não fecha, a camisa que escapa dos ombros, a calça que se nega a ser justa. Tudo é feito para o movimento. E ainda assim, é elegante. Silhuetas amplas, tecidos com textura de pausa e uma cartela de cores que não tenta agradar: verdes fechados, cinzas esmaecidos, um ou outro tom de areia.

É uma moda silenciosa, mas de impacto duradouro — aquela que permanece na memória muito após o desfile terminar.


 


Alfaiataria escandinava com estrutura leve e ritmo urbano (Foto: reprodução/Instagram/@mkdtstudio)

Gestuz: a tensão entre o rígido e o fluido

Houve quem passasse batido pela coleção da Gestuz. Mas quem parou para observar com atenção entendeu: havia um discurso ali — silencioso, contido, quase tímido, mas ainda assim forte.

A marca apostou em sobreposições inesperadas, couro como segunda pele, e tecidos que parecem ter sido rasgados e costurados no mesmo instante. Um vestido desfiado, uma manga que se transforma em alça, uma saia que parece ter sido herdada — e reinventada.

No styling, predominou o preto — mas não o preto óbvio. Era um preto que carregava, ao mesmo tempo, peso e leveza. Um preto que falava de controle, mas também de fuga. É nesse paradoxo que a Gestuz constrói seu universo.


 

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Ousadia sutil e cortes que flertam com o caos (Foto: reprodução/Instagram/@gestuz)

Baum und Pferdgarten: o erro como charme

Ver uma coleção da Baum und Pferdgarten é quase como assistir a um filme improvisado — nada parece sair como o previsto, e isso é exatamente o que encanta. Cores que brigam, estampas que parecem se repelir, proporções que desafiam o espelho — e, ainda assim, tudo funciona.

A marca mais uma vez brincou com a ideia de acerto imperfeito: saias bufantes com jaquetas esportivas, meias transparentes com sandálias fechadas, blazers que parecem grandes demais. Mas há inteligência por trás dessa brincadeira — e é isso que transforma o caos em charme.

Não é moda para agradar. É moda para divertir, provocar, causar estranhamento — e, depois, conquistar.



Cores que conversam no contraste (Foto: reprodução/Instagram/@baumundpferdgarten)

Rave Review: roupas com memória de casa

A marca sueca Rave Review talvez tenha sido a que mais emocionou. Não por fazer drama, mas justamente por evitá-lo. As roupas, confeccionadas a partir de tecidos reutilizados, têm cheiro de avó, textura de infância e peso de história.

Lençóis antigos viraram vestidos. Cortinas se tornaram casacos. Colchas desbotadas agora são saias com dobras inesperadas. A costura é visível, proposital, quase artesanal — mas sem cair na estética forçada de brechó.

Há uma delicadeza ética na forma como a marca constrói seu repertório, e um cuidado quase íntimo na apresentação das peças. São roupas que escutam antes de falar.


Upcycling como gesto político (Foto: reprodução/Instagram/@ravereviewclothes)

Cecilie Bahnsen: entre o ar e o chão

Se há alguém que conseguiu unir o etéreo ao concreto nesta temporada, foi Cecilie Bahnsen. A estilista dinamarquesa, que comemorou dez anos de marca, optou por não começar do zero. Em vez disso, revisitou arquivos, reaproveitou tecidos e refez caminhos.

O resultado foi uma coleção que parecia suspensa, como se cada vestido flutuasse poucos centímetros acima do chão. Tules, brocados, laços soltos, volumes sussurrados — e, ainda assim, tudo muito físico, real e vivo.

A abertura com Ísadóra Barney, filha de Björk, foi mais do que simbólica: foi quase um rito de passagem. Cecilie não está apenas desenhando roupas; está redesenhando lembranças.



Tule, memória e leveza arquitetada (Foto: reprodução/Instagram/@ceciliebahnsen)

Copenhague e a autenticidade discreta

A moda de Copenhague transmite a sensação de não estar preocupada em convencer ninguém. Ela simplesmente existe, propõe e experimenta. Se alguém se identifica, ótimo; caso contrário, segue seu caminho sem alarde.

Cinco marcas desta edição traduzem esse espírito de forma genuína — algumas com ousadia, outras mais contidas. Todas, no entanto, compartilham uma relação honesta com o que produzem.

No cenário atual, talvez o mais revolucionário seja essa postura: não ser barulhenta, mas verdadeira.

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