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Zé Carioca 80 anos: Disney aposta na nostalgia para um Brasil mais solidário

Depois de um período de interrupção na produção dos HQs de Zé Carioca. A Disney promete uma versão mais solidária do personagem em sua comemoração dos 80 anos.

14 Ago 2022 - 22h51 | Atualizado em 14 Ago 2022 - 22h51
Zé Carioca 80 anos: Disney aposta na nostalgia para um Brasil mais solidário  Lorena Bueri

Um malandro light. É assim que Roberto Elísio, um dos especialistas na criação de quadrinhos, define o papagaio Zé Carioca oitentão. É o único personagem da Disney que vive no mundo real com avenidas, ruas, favelas, prédios e praias; Joe, depois José (pronunciado como no espanhol) e finalmente Zé Carioca, como é conhecido mundialmente. O personagem foi criado em 1941 durante à “política de boa vizinhança” do governo Franklin D. Roosevelt, eufemismo diplomático que se traduziu, na área cultural, em ações de propagandas do Escritório para Assuntos Interamericanos (OCIAA, na sigla em inglês), criado um ano antes pelo governo americano com o intuito de exportar valores ianques para os vizinhos em momento de expansão do nazi-fascismo.

"O papagaio mais famoso da cultura pop nasceu em um exercício do que hoje chamamos de soft power", diz o pesquisador, um dos coordenadores do Observatório de História em Quadrinhos da ECA/USP.

Dois dias após o Brasil declarar guerra a Alemanha e Itália, em 24 de agosto de 1942, "Alô Amigos" conseguiu sua estreia mundial no Rio. As quatro animações de 42 minutos são, reunidas, é o longa mais curto da Disney e um sucesso de bilheteria à época. Zé Carioca aparece no derradeiro segmento, quando recebe o Pato Donald no Rio ao som de “Aquarela do Brasil”, de Ary Barroso e “Tico-Tico no fubá”, de Zequinha de Abreu.


Revista do 'O Pato Donald', com participação de Zé Carioca (Foto: Reprodução/Divulgação)


"A senha para a dimensão que ele terá está logo na primeira cena com Donald, quando o Pato lhe estende a mão e o papagaio lhe dá um ‘abraço de quebrar costelas’. Ele representa, já ali, a visão do brasileiro cordial que tanto encantou Walt Disney", diz o jornalista Paulo Maffia, editor-chefe da Culturama, que hoje publica as tirinhas do Zé no Brasil.

Existe uma lenda que quando Walt Disney visitou o Rio de Janeiro, ouviu uma piada de um papagaio e rabiscou em um guardanapo do Copacabana Palace, como poderia ser o personagem malandro. Então pediu para que alguns cartinistas locais pudessem fazer esboço do então personagem. O de J. Carlos incluía até o abraço de Donald, porém segundo Elísio, "ficou muito formal". 

A referência usada para a fala rápida e a simpatia do Zé da animação teria sido o músico José do Patrocínio Oliveira, o Zezinho do Bando da Lua de Aloísio de Oliveira, que é o dono da trilha sonora de “Alô, amigos”. Paulista de Jundiaí, é de Zezinho a voz do Zé Carioca no filme.

"O Walt conheceu e gostava do Zezinho, assim como tinha predileção especial pelo personagem. Tanto que Zé Carioca apareceria novamente em “Você já foi a Bahia?” (1944) e “A culpa é do samba” (1948), além de pelo menos três animações da TV americana. Mais tarde, fez uma ponta em “Uma cilada para Roger Rabbit” (1988) e está nos parques temáticos", conta Becky Cline, diretora há três décadas do Walt Disney Archives. Ela segue: "Há muitas versões para a gênese do personagem, mas o essencial, para Walt, era que Zé Carioca complementava Donald, trazia suavidade, vivência e ritmo que faltavam ao americano", aponta.

Sensibilidade Social

Os quadrinhos começam a circular após o sucesso do filme. Nos EUA, a partir de outubro de 1942, nas "Silly simphonies", encartadas em vários jornais. No Brasil, o primeiro registro de sua publicação é de fevereiro do ano seguinte, na revista O Globo Juvenil. Entre 1944 e 1945, eles também apareceram no jornal O GLOBO, no caderno especial dedicado à Força Expedicionária Brasileira, que lutava na Europa contra o Eixo.

Muito criticado dentro e fora da academia por apresentar uma visão estereotipada negativa dos brasileiros, caracterizada pelo personagem folgado, que sobrevive à base de cambalachos, Zé Carioca já nasceu, no entanto, inovador, defende seu atual editor no Brasil.


Tirinha Zé Carioca (Foto: Reprodução/Divulgação)


"Walt Disney queria transportar a realidade dos cidadãos comuns para a fantasia pop. Se Donald anda de ônibus e trabalha para cuidar dos três sobrinhos, Zé Carioca se vira nas onze para, sem buscar trabalho, sobreviver na rotina mais colorida, porém socialmente precária do Rio", diz.

O papagaio passou por mutações sensíveis em oito décadas. A mais significativa, para leitores brasileiros, foi quando deixou de ser desenhado e roteirizado por profissionais americanos, no fim dos anos 1950. E teve seu primeiro desenhista brasileiro, Jorge Kato, presente na primeira história, de 1961, de “O essencial do Zé Carioca”, uma coletânea de 14 HQs lançada por Maffia na Bienal do Livro de SP é o pontapé inicial das comemorações dos 80 anos da ave.

"Ele foi o primeiro personagem da cultura pop brasileira a ter histórias ambientadas em uma favela, a fictícia Vila Xurupita. Lá, retrata a dificuldade dos moradores, a falta de serviços básicos e a importância de se agir em prol da comunidade", diz Maffia.


Tirinha Zé Carioca (Foto: Reprodução/Divulgação)


A partr desse momento a revitinha ganhou mais a cara do Brasil, indo além da visão esteriotipada dos primeiros roteiristas, e mostrando a verdadeira realidades dos morrs cariocas através da experiência pessoal do roteirista paulista Ivan Saidenberg:

"Ele ouvia causos sentado em botequins na subida do Cantagalo. Gente que falava da falta d’água e de luz, por exemplo. Em uma de suas tiras, “Papagaio Disco Clube”, de 1980, Zé tenta organizar uma festa, mas se enrola com a quantidade de gatos na área."

Com um Zé mais abrasileirado, o humor se revela, diz Roberto Elísio, justamente nos golpes que não funcionam. O personagem originalmente criado para servir de exótico guia ao americano interessado nas belezas do Brasil se torna um crítico bem-humorado das mazelas do país.

"As complicações do governo militar com o FMI, por exemplo, foram traduzidas na Anacozeca, a Associação Nacional de Cobradores do Zé Carioca. Desta época também são os desenhos do Renato Canini, com ônibus lotados, mulheres subindo o morro com trouxa de roupa na cabeça e criança de mãos dadas ao lado", diz.

O lema do brasileiro é não desistir

Os quadrinhos do Zé Carioca passaram por um período de interrupção no fim dos anos 1990, com o fim da produção pela Abril. Depois teve um breve retorno em 2014, e desde 2020 estão sob o comando da Maffia na Culturama, que publicou no ano passado a primeira graphic novel do papagaio, “Viagens fantásticas”.


Graphic Novel de Zé Carioca (Foto: Reprodução/Divulgação)


O Zé 8.0 que aparece no quadrinho inédito produzido pela Culturama se moldou aos novos tempos. O jogo de cintura segue, mas golpes como a venda do Pão de Açúcar a gringos incautos foram aposentados. A Diretora Criativa da Disney Brasil, Tokie Esaka diz que o Zé de 2022 está trabalhado no otimismo, na solidariedade, na nostalgia de um país menos polarizado e no brasileiro que não desiste nunca.

"O bem-vindo politicamente correto não asfixia o humor do personagem. Octogenário, ele aprende com a sociedade e segue exalando o melhor dos Zés e dos cariocas: generosidade e sagacidade", aposta Maffia.

Além do licenciamento comercial da imagem do personagem — com expectativa de crescimento de 250% este ano — a Disney produz para os 80 anos um livro de Eduardo Bueno com o papagaio mostrando a sua versão nos episódios da história brasileira e um single e clipe, “Os Zés do Brasil”, com Xande de Pilares. A letra do samba de Leandro Lehart diz que “tô na rua, na luta, com amor, nascido e criado no Brasil, sou do povo, festeiro e vencedor”.

 

Foto destaque: Zé Carioca. Reprodução/Divulgação

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