O que aconteceu com a Akon City, que chegou a ser chamada de Wakanda da vida real? Essa pergunta vem ganhando força desde que o cantor e empresário senegalês-americano Akon anunciou em 2018 um projeto de cidade futurista inspirada em Wakanda, do universo de Pantera Negra. A proposta surgiu como um marco para o Senegal e para o continente africano, prometendo inovação e desenvolvimento econômico, além de soluções de mobilidade que incluiriam até carros voadores em um futuro distante. Ao longo dos anos, no entanto, a ideia enfrentou dificuldades para sair do papel e continua sendo tema de debate entre especialistas e a população local.
A localização escolhida para a construção da cidade é a vila costeira de Mbodiène, a cerca de 100 km ao sul de Dakar. Em uma área de 8 km², Akon City foi apresentada como o futuro para a economia e a cultura do Senegal, com projetos de centros comerciais, hospitais, universidades, hotéis de luxo e até uma usina solar de 120 megawatts. Um ponto central dessa promessa era o uso da criptomoeda Akoin, idealizada para impulsionar a economia local e criar uma identidade financeira própria para a cidade.
Apesar das intenções e da repercussão mundial, em 2025 o cenário real mostra um ritmo muito abaixo do esperado. O único espaço parcialmente construído é o chamado Welcome Center, enquanto o restante do projeto não avançou além do cercamento e das promessas. Essa lentidão contrasta com o entusiasmo inicial, que previa a primeira fase concluída ainda em 2023.
Primeiros passos e expectativas
Akon City foi anunciada com a ideia de criar um espaço de inovação e desenvolvimento, reunindo investidores e empresários do mundo todo. A apresentação oficial trouxe expectativas de parcerias estratégicas e de um ambiente favorável para negócios que pudessem beneficiar não apenas a vila de Mbodiène, mas o Senegal de forma geral. O cantor destacou a importância de criar oportunidades para jovens africanos, buscando trazer emprego e infraestrutura para a região.
Durante os primeiros anos, o projeto ganhou destaque em reuniões e eventos internacionais, sendo celebrado como símbolo de modernização e de uma nova era para o país. A proposta era de uma cidade planejada, com ruas largas, zonas residenciais, parques e tecnologias de ponta para transporte e energia. A ideia de mobilidade incluía o uso de carros elétricos, ônibus movidos a energia limpa e até uma pista de pouso para táxis aéreos.
As projeções otimistas para a Akon City previam que tudo estaria em operação até 2030, incluindo um sistema de transporte coletivo conectado com bicicletas e veículos compartilhados. Essas metas, porém, começaram a se mostrar distantes conforme passavam os anos e as obras não avançavam.
Obstáculos enfrentados
A falta de investimentos concretos e a ausência de um cronograma claro impactaram diretamente o projeto. Em 2020, uma parceria com a empresa americana KE International prometeu levantar US$ 4 bilhões para iniciar as obras, mas segundo relatos de antigos colaboradores, esses recursos não chegaram à prática. O empresário Julius Mwale, ligado ao financiamento, também esteve envolvido em projetos no Quênia que não avançaram como planejado.
A pandemia de COVID-19 contribuiu para atrasos, dificultando ainda mais a busca por investidores e o início efetivo das construções. Akon reconheceu que o anúncio de Akon City foi feito antes de garantir todas as parcerias e recursos, o que agravou as críticas sobre a viabilidade real do projeto. A criptomoeda Akoin, tida como um diferencial, também perdeu força, sofrendo desvalorização e impactando o plano financeiro original.
Enquanto isso, o governo senegalês passou a pressionar a equipe responsável pela Akon City. Por meio da Sapco, a agência responsável pela promoção de zonas turísticas, foi emitido um ultimato em 2024, exigindo a retomada das obras ou a devolução de 90% das terras que haviam sido destinadas ao projeto. Essa cobrança adicionou uma camada de tensão às incertezas sobre o futuro do projeto.
Mobilidade e transporte
No projeto inicial, a questão da mobilidade foi tratada como prioridade, com planos de criar uma rede de transporte coletivo movida a energia limpa. A proposta incluía ônibus elétricos, carros compartilhados e ciclovias integradas ao sistema viário da cidade, tudo para garantir conforto e sustentabilidade na locomoção de moradores e turistas. Além disso, as ruas largas e as áreas verdes planejadas buscavam incentivar caminhadas e trajetos de bicicleta em toda a extensão de Akon City.
Outra ideia que chamou atenção foi a promessa de que a cidade, no longo prazo, poderia contar com carros voadores e drones para transporte de passageiros e mercadorias. Essa visão futurista fez parte das apresentações do projeto como uma maneira de se destacar e atrair curiosidade de investidores e da imprensa internacional.
Apesar dessas promessas, até 2025, nada além do Welcome Center foi erguido. As estradas e avenidas amplas que apareciam nas imagens de divulgação ainda não saíram do papel, e a população de Mbodiène continua utilizando veículos convencionais em estradas de terra para acessar outras cidades. A perspectiva de modernização da mobilidade permanece como parte do discurso, mas ainda sem qualquer sinal concreto de execução.
“Quando se fala de mobilidade, não basta sonhar com um ESG perfeito. É preciso por os pés no chão e começar pelo possível, para depois alcançar a perfeição.” – Alan Corrêa, especialista em transportes do Carro.Blog.Br
Perspectivas e próximos passos
Diante do cenário de atrasos, Akon declarou que a Akon City segue em desenvolvimento, mas que o cronograma foi reavaliado para levar até 15 anos. Isso significa que a cidade, antes prevista para 2030, agora só deve ficar pronta em 2036, caso o projeto realmente retome o ritmo. Segundo Akon, essa mudança de prazo seria essencial para encontrar novos investidores e parcerias que permitam viabilizar as promessas de inovação.
Enquanto isso, moradores e analistas seguem divididos entre a esperança de que o projeto gere oportunidades e o ceticismo de que as promessas continuem apenas no discurso. O governo senegalês, por sua vez, segue acompanhando de perto as negociações, buscando garantir que os interesses locais sejam atendidos caso a Akon City saia do papel.
Foto destaque: Akon (reprodução/divulgação)