[Crítica] “Hurry Up Tomorrow: Além dos Holofotes” é um passeio psicodélico pela mente de The Weeknd
Surpreendente e magnético, filme inspirado no álbum de mesmo nome do astro canadense já está em cartaz nos cinemas; confira nossa crítica

“Agora estou pronto para o fim (…) Eu aceito que seja o fim” – “Hurry Up Tomorrow” (2025)
Quais sombras se escondem em uma mente musicalmente brilhante? Como a fama é capaz de deteriorar um ser de dentro para fora? Baseado no álbum homônimo, o mais recente do cantor, o longa “Hurry Up Tomorrow: Além dos Holofotes” é um convite para um passeio psicodélico por dentro da mente perturbadora e fascinante de The Weeknd, até que ele se despeça, para que Abel Tesfaye finalmente possa vir à vida. Dirigido por Trey Edward Shults (“Waves”), estrelando Abel Tesfaye (o próprio The Weeknd), também produtor e roteirista, Jenna Ortega (“Wandinha”) e Barry Keoghan (“Saltburn”), a obra, que chega hoje (15) aos cinemas do Brasil, se desdobra em um thriller surpreendentemente magnético.
Trama de “Hurry Up Tomorrow: Além dos Holofotes”
Vivendo um personagem baseado em si mesmo, The Weeknd é um popstar em turnê, assombrado pelo fim turbulento e não superado de um relacionamento, à beira de um colapso emocional que começa a atrapalhar até mesmo seu material de trabalho: a voz.
Assista ao trailer de “Hurry Up Tomorrow” (Reprodução/YouTube/The Weeknd)
Quando todas as amarras de um passado repleto de arrependimentos, se soma à pressão de ser um “super heroi” para os milhares de fãs que o esperam em um estádio lotado, o músico embarca em uma noite de escapismo com uma estranha misteriosa, que parecia estar na hora e no lugar certo, obcecada por ele. A relação relâmpago se transforma em um jogo doentio quando Ani (Jenna Ortega) se torna a personificação de tudo que The Weeknd quer se livrar em si mesmo.
O caos obscuro da fama volta a ser tema para The Weeknd
Mesmo que ficcional, “Hurry Up Tomorrow” é quase uma autobiografia psicológica, levando o público direto para os bastidores da atual turnê do cantor, em um cenário idêntico ao que trouxe a São Paulo em 2024. Em certos momentos do longa, é como estar em um show, mas dessa vez, na perspectiva vertiginosa de quem está no palco. Luzes incessantes piscando, milhares de silhuetas ao redor, impossíveis de serem enxergadas e a pressão de satisfazê-las. Parece muito, principalmente para alguém quebrado e aparentemente incapaz de derrotar seus próprios demônios. Esse é o cenário em que a obra nos imerge de forma angustiante, ácida e com uma autoironia bem-vinda para lidar com situações reais enfrentadas por Abel durante a carreira, como o fracasso da série “The Idol”, o problema vocal que passou em 2022 e fins de namoros que inundaram os tabloides.
Ouça ao álbum “Hurry Up Tomorrow” (Reprodução/Spotify)
Os temas já recorrentes na trilogia de álbuns encerrada com o mais recente – “After Hours”, “Dawn FM” e “Hurry Up Tomorrow” –, as diferentes fases da fama, desde o deslumbre sufocante dos holofotes até o purgatório do fim do poço, se tornam repertório para o filme, que funciona de maneira complementar ao disco homônimo. Cuja canção que leva o mesmo nome – e finaliza o disco – sugere nas entrelinhas: The Weeknd precisa chegar ao fim para que Abel possa voltar à vida, e esse é o fio norteador para o passeio por dentro da psique do cantor. Aqui, as músicas inundam a obra como uma trilha sonora potente, mas por vezes exagerada, sem a obrigatoriedade linear de passear por todas elas, como um álbum visual faria.
The Weeknd em cena de “Hurry Up Tomorrow” (Foto: reprodução/Paris Filmes)
A produção pode pecar, por vezes, pelo excesso, mas não pela falta. É inegável o uso demasiado de efeitos visuais que muito bem ilustrariam um videoclipe, mas que aqui, chega a quase desgastar e passar a sensação de estarmos assistindo MTV dos anos 2000 por 106 minutos seguidos. Trey também segue uma escolha bem clara de se aprofundar no olhar, quase sempre desesperado, de The Weeknd, como se tentasse invadi-lo para compreendê-lo.
O hoje pode ser de The Weeknd, mas o amanhã é de Abel
É interessante notar como Abel não se põe como um salvador, mas como alguém instável, machucado e fatidicamente superficial, que precisa de redenção para se reencontrar e para que deixe também de destruir todos ao seu redor com sua própria dor. É desse The Weeknd que ele precisa compulsivamente se livrar, e que é reforçado através de seus colegas de elenco. Os personagens de Keoghan e Ortega funcionam como cacos desse mesmo vidro, projeções do protagonista ou de quem já fez parte de sua vida. Ele, o estereótipo do empresário sanguessuga, que prioriza o lucro em detrimento da saúde do artista. Ela, seus demônios, sua toxidade, seu medo do abandono e obsessão consigo mesmo, relembrando seus fracassos e erros.
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“Hurry Up Tomorrow” é um convite para que seus fãs se despeçam desse alter ego para que possam seguir junto com Abel no “paraíso” que vem após a morte do eu-lírico citado na faixa que leva o mesmo nome. Muito pouco tangível e por vezes pouco claro, como a própria confusão mental do personagem, essa trama carregada por analogias e metáforas deságua em um suspense (com pitadas de drama e terror) capaz de te prender, se você se permitir embarcar nessa viagem mental. E apesar de não ser, definitivamente, um ótimo ator, The Weeknd se sai melhor vestindo uma versão de si mesmo, que dando vida a outro personagem.
No fim, mesmo que funcione melhor para os fãs do artista, “Hurry Up Tomorrow: Além dos Holofotes” surpreende de forma positiva, apresentando um passeio impetuoso por dentro do cerne genial e assustador de The Weeknd e dando espaço para que Abel Tesfaye o enterre, abrindo os portais para uma nova Era, para que possa mostrar quem verdadeiramente é. Apresse-se, o amanhã chegou.
Nota: ★★★½
Foto destaque: Jenna Ortega e The Weeknd no pôster de “Hurry Up Tomorrow: Além dos Holofotes” (Reprodução/Paris Filmes)