Os venezuelanos foram às urnas, no último domingo (3), para participar de um referendo sobre a região Essequibo, um território que o país reivindica da vizinha Guiana. O resultado foi que mais de 95% dos eleitores votaram em incorporar oficialmente a região ao mapa do país, e com isso conceder cidadania e documentos de indentidade para cerca de 120 mil guianenses que vivem no território.
Segundo o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) venezuelano, cerca de 10,5 milhões de pessoas participaram do referendo, dos quais 95,93% aceitaram incorporar a região ao país. Por outro lado, apenas 4,07% dos eleitores discordaram da proposta do referendo. Ao todo 20,7 milhões de venezuelanos foram chamados para votar, o país tem uma população de cerca de 30 milhões de habitantes.
O presidente venezuelano comemorou o resultado do referendo, e afirmou que:”Trata-se de um referendo histórico que colocou a Venezuela de pé e agora é hora de recuperar o que os libertadores nos deixaram”.
Presidente da Guiana minimiza o resultado do referendo
Pelo lado da Guiana, o presidente do país, Mohamed Irfaan Ali, afirmou que muitos guianenses viram o referendo com suspeita. O mandatário ainda disse que “não há nada a temer nas próximas horas, dias e meses”.
Irfaan ainda acrescentou que o país usa a diplomacia como sendo a sua “primeira linha de defesa” e trabalha continuamente para garantir que as suas “fronteiras permaneçam intactas”, afirmou o presidente do país por meio de uma postagem no Facebook.
Origem da disputa pelo território Essequibo
Venezuela e Guiana disputam o território Essequibo desde o fim do século 19. A região representa 70% do atual território da Guiana e é casa para cerca de 125 mil pessoas. Na Venezuela, a região é chamada de Guiana Essequiba.
É uma área que tem uma mata densa, e no ano de 2015, a empresa americana ExxonMobil descobriu petróleo nas águas da região. Estima-se que o país tenha cerca de 14,8 bilhões de barris de petróleo, sendo que a parte mais significativa é "offshore", ou seja, no mar, perto de Essequibo. Por conta do petróleo, a Guiana é o país sul-americano que mais cresceu nos últimos anos.
Ambos os dois países afirmam ter direito sobre o território com base em documentos internacionais. Com base nesses dois argumentos abaixo:
- A Guiana afirma que é a proprietária do território pelo fato de existir um laudo do ano 1899, feito em Paris, no qual foram estabelecidas as fronteiras atuais. Naquela época, a Guiana pertencia ao Reino Unido.
- A Venezuela afirma que o território pertence ao país, pois assim consta em um acordo firmado em 1966 com o próprio Reino Unido, antes da independência de Guiana, no qual o laudo arbitral foi anulado e se estabeleceram bases para uma solução negociada.
Guiana havia pedido ajuda na corte internacional
Guiana pediu que a corte internacional de justiça tomasse uma medida de emergência para interromper a votação na Venezuela. O tribunal decidiu que a Venezuela não podia tentar anexar a região de Essequibo.
Mais cedo neste ano, em abril, a Corte Internacional de Justiça afirmou ter legitimidade para tomar decisões sobre a disputa. O órgão é a corte mais alta da Organização das Nações Unidas (ONU) para a resolução de disputas entre estados, mas não tem como fazer suas determinações serem cumpridas ao redor do mundo.
Visão do governo brasileiro sobre a situação
O governo brasileiro vê a situação com preocupação, a secretária de América Latina e Caribe do Itamaraty, a embaixadora Gisela Padova, afirmou ao G1 que o Itamaraty tem acompanhado a situação com atenção e o ex ministro da relações exteriores esteve na Venezuela e que o Brasil está conversando com Guiana :”Temos acompanhado com atenção e conversado com altíssimo nível -- vocês se recordam que o embaixador Celso Amorim foi a Caracas se reunir com o governo -- e nós também estamos tendo conversas com a Guiana".
Segundo a agência de notícias Reuters, a ida de Amorim à capital venezuelana aconteceu há uma semana. Ela foi um pedido feito pelo presidente Lula, depois de uma avaliação brasileira de que a campanha venezuelana sobre a anexação do Essequibo teria subido demais o tom.
O governo brasileiro não chegou a pedir pelo cancelamento do referendo, mas solicitou a Nicolás Maduro que diminuísse o tom da campanha e buscasse uma solução pacífica. Segundo o G1, Lula recebeu uma ligação do presidente da Guiana, Irfaan Ali. Os dois líderes chegaram a marcar uma reunião na COP28, em Dubai, porém o encontro foi adiado.
Lula durante a COP29. (Foto: reprodução/ RICARDO STUCKERT/PR)
O presidente Lula, por sua vez, defendeu o "bom senso" entre os dois países, afirmando que: "Espero que o bom senso prevaleça, do lado da Venezuela e do lado da Guiana", disse o presidente brasileiro durante a COP28.
Na semana, durante uma reunião da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), em Brasília, representantes dos dois países trocaram provocações e foi preciso a interferência de outros países para impedir uma escalada na discussão.
Foto destaque: Nicólas Maduro após divulgação de resultado do referendo. (Reprodução/Matias Delacroix /AP Photo)