Seu Jorge, um dos cantores de maior sucesso do país, foi vítima de vaias e xingamentos racistas durante um show realizado em Porto Alegre na última semana, no Clube Grêmio Náutico União.
De acordo com testemunhas presentes no local, o cantor foi xingado de macaco após fazer um discurso onde disse ser contra a maioridade penal.
Em entrevista ao Fantástico, Seu Jorge relatou os momentos que precederam seu discurso:
“Eu cantei, fiz meu concerto. Em determinado momento, fiz uma fala sobre a infância e adolescência. Entendo que, quando a gente trata da redução da maioridade penal, o foco atingido é a população jovem negra. E lisa Lucinda falou uma coisa muito interessante: ‘ninguém confunde a Eliana com a Xuxa, uma Grazi Massafera com a Gabriela Priolli, sabe? Mas a gente vai preso confundido. É morto confundido”.
Após essa declaração, o músico conta que ao final do show, já quando deixava o palco, percebeu vaias, mas que isso “era do jogo”.
Entretanto, ao final da apresentação, alguns vídeos começaram a circular nas redes sociais, onde é possível ouvir parte do público presente fazendo sons que seriam imitações de macacos. Seu Jorge conta que não havia ouvido os xingamentos e somente quando uma pessoa publicou as injúrias ele teve conhecimento do episódio.
Ao Fantástico uma fã do cantor — que preferiu não se identificar — conta o que presenciou durante o show:
“Estava tudo normal. O show maravilhoso. E aí ele apresentou o Pedrinho (da Serrinha) e falou então sobre a juventude negra, sobre o negro da favela e que ele é contra a redução da maioridade penal. Nesse momento, as pessoas se transformaram. Foi um show de horrores, uma grosseria”, conta a fã.
Registros dos xingamentos racistas sofridos por Seu Jorge (Video:Reprodução/Poder 360)
Três testemunhas fizeram denúncias e prestaram depoimento na delegacia especializada em combate à intolerância de Porto Alegre. Durante o depoimento, uma delas afirma que “pessoas que estavam do lado direito da pista começaram a se exaltar com as falas do cantor e proferiram injúrias raciais, vaias e xingamentos. Com imitação de som de macaco e xingamento de macaco”. Também foi relatado que os xingamentos de “vagabundo” e “preguiçoso” foram feitos ao músico.
A delegacia instaurou um procedimento policial de ofício — sendo assim a investigação será feita, mesmo sem que alguma vítima tenha feito o registro do boletim de ocorrência -. Novas testemunhas devem ser chamadas para prestar depoimento.
A denúncia foi feita ao Ministério Publico por Lúcio Almeida, representante do núcleo de Pesquisa Antirracista da Universidade Federal do Rio Grande do Sul assim que o mesmo soube do ocorrido. Lúcio afirma que “O ato de racismo sofrido pelo Seu Jorge é um ato normal em nossa sociedade. Atos que ocorrem todos os dias e que, de certa forma, só tivemos o conhecimento porque se tratava de um grande artista”.
Ainda durante sua entrevista, Seu Jorge disse:
“Estamos tratando de violência. Racismo, não. Racismo, não. Simples assim. Eu acho que não estamos tratando de política aqui. Estamos tratando de uma violência que não cabe mais no Brasil. A justificativa para o racismo não existe, assim como o racismo não deveria existir”.
No último sábado (22) manifestações foram feitas na porta do local. O clube Grêmio Náutico União, disse em nota que lamenta os fatos ocorridos durante a apresentação.
“Devemos todos combater o racismo. Eu sou um homem negro brasileiro. Eu sou um africano nascido no Brasil. Me sinto assim, me reconheço assim. E tenho um amor muito grande pelo meu país, pela minha nação, mas entendo que existe um atraso e uma dívida muito grande do Brasil para com o povo afrodescendente”, finalizou Seu Jorge.
Após o caso de racismo com o cantor, oito sócios do clube publicaram uma carta aberta ao público. Na carta os sócios reforçam a necessidade do local excluir os associados caso sejam identificados como participantes dos xingamentos racistas. Desde a publicação, cerca de 100 sócios também assinaram o documento.
Foto Destaque: Seu Jorge / Reprodução: Mais Goiás