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STJ permite aplicação da Lei Maria da Penha para mulheres trans

Superior Tribunal de Justiça viabiliza aplicação da Lei Maria da Penha para mulheres trans. Ministros entendem que proteção deve ser garantida a mulheres que se identificam como tal, independente do sexo biológico

06 Abr 2022 - 15h02 | Atualizado em 06 Abr 2022 - 15h02
STJ permite aplicação da Lei Maria da Penha para mulheres trans Lorena Bueri

Em 2006, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou a lei nº 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha. A mulher referida na lei, Maria da Penha Maia Fernandes, sofreu agressões e tentativas de feminicídio inúmeras vezes após se casar com Marco Antonio, o autor dos crimes, em 1976. Frente a tamanha violência, Maria da Penha lutou por justiça durante 19 anos, enquanto via um Estado inerte diante da gravidade do caso. 

Sua luta por justiça tomou uma nova configuração quando a lei foi sancionada, visto que a partir daí, mulheres vítimas de violência doméstica passariam a ter respaldo jurídico. Nas disposições da lei, consta que devem ser criados mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra as mulheres. A elas, deve ser assegurado o direito à vida, à segurança, à saúde, à alimentação e outros mais. 


Maria da Penha Maia Fernandes. (Foto: Reprodução/Jarbas Oliveira)


Nesta terça-feira (05), a 6ª turma do Superior Tribunal de Justiça definiu que a lei citada pode ser aplicável a mulheres trans. A discussão inédita pretende ampliar a proteção para o segmento, que é copiosamente violentado. 

No caso analisado pelo STJ, uma mulher trans sofreu agressões de seu pai devido à recusa em aceitá-la, e, por isso, ela solicitou medidas protetivas. De acordo com a CNN Brasil, a vítima contou que sofreu agressões que deixaram marcas visíveis, identificadas pela polícia. O pai da mulher teria chegado em casa alterado e, ao vê-la tentar sair da residência, teria jogado ela na parede e a empurrado. Ainda, o homem teria feito ameaças com um pedaço de madeira, até ela conseguir fugir do local.

Sobre este caso, os desembargadores da 10ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) deliberaram uma negativa a respeito da adoção de medidas protetivas. Em justificativa, a Justiça de São Paulo alegou que a aplicação da lei é exclusiva a pessoas do sexo feminino, considerando apenas o sexo biológico, o que exclui a população trans. 

Para determinar o emprego da lei a mulheres transgênero, os ministros analisaram um recurso do Ministério Público que negava a decisão da Justiça de São Paulo. Os ministros da Sexta Turma foram unânimes no entendimento de que o artigo 5º da Lei Maria da Penha qualifica a violência doméstica e familiar contra a mulher como qualquer ação ou omissão baseada no gênero, porém, essa determinação não envolve aspectos biológicos. 


Direitos à população trans devem ser garantidos. (Foto: Reprodução/Frei Caneca FM)


O ministro Rogério Schietti, relator do caso, relembrou a violência sofrida por pessoas trans e reforçou que a decisão inicial reflete aspectos da cultura patriarcal e misógina instaurada no Brasil. Nas palavras do relator, no ano passado foram 140 assassinatos, dado preocupante tendo em vista que demonstra o preconceito ainda existente na sociedade. Para ele, a lei deve abrigar e proteger mulheres que se identificam como tal, independente do sexo. Nesse sentido, a subprocuradora-geral da República, Raquel Dodge, e a ministra Laurita Vaz, corroboram as ideias de Schietti. 

Laurita afirma que a realidade brutal vivenciada pelas mulheres transgênero tem traços em comum com a violência praticada contra mulheres cisgênero. Para a ministra, os atos têm a mesma origem: a discriminação de gêneros. Além disso, ela pontua que a mulher trans é agredida justamente pela sua condição de mulher, e os dados revelam que essas agressões ocorrem principalmente no lar de pessoas conhecidas, como familiares. 

O Brasil é o país que mais mata travestis e transsexuais no mundo. Segundo a Associação Nacional de Travestis e Transsexuais (ANTRA), os assassinatos de pessoas trans aumentaram em 90% no primeiro quadrimestre de 2020 - período que se iniciou a pandemia do coronavírus - em relação ao ano de 2019. De acordo com o portal da ANTRA, era esperado que esse índice sofresse queda em razão da necessidade de isolamento social. Contudo, vendo o aumento dos casos de assassinato, é possível observar o quanto a população trans continua sendo marginalizada e privada de direitos básicos, como a segurança.

 

Foto Destaque: Manifestação contra a violência direcionada a pessoas trans. Reprodução/Litci

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