O Ministério da Saúde decretou na última sexta-feira (20), em edição extra do Diário Oficial da União, Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional para combater a desassistência sanitária da população yanomami, em Roraima. Um dia depois do anúncio, a comandante da pasta, Nísia Trindade, declarou que grande parte do que é observado nessas terras indígenas é uma consequência do garimpo ilegal.
“Nós caracterizamos esse episódio como uma situação de desassistência. Isso significa que essa população está sem o devido cuidado por parte do Sistema Único de Saúde (SUS) e isso acontece por várias questões. Grande parte da razão por tudo isso está na desorganização social provocada pela atividade do garimpo ilegal”, afirma Trindade em entrevista á BBC News Brasil, em Buenos Aires. “Essa atividade gera contaminação dos rios e cria escavações que geram depósitos de água em que há proliferação de mosquitos. Com isso, há um aumento muito grande nos casos de malária.”
Na Terra Yanomami, considerada uma das maiores reservas indígenas do país, o governo calcula ainda que 570 crianças yanomami morreram por desnutrição, fome e contaminação por mercúrio nos últimos quatro anos. Outro problema, apontado pelo governo federal como fator que contribuiu para a situação de emergência na região, é a falta de profissionais e insumos em muitos polos de atendimento.
“Pelo menos desde a transição de governo, eu já vinha acompanhando esses sinais. Nós tivemos uma reunião com lideranças yanomami e com lideranças políticas. Nos foi colocada, também, uma questão sobre a possibilidade de desvio de medicamentos. Mas o grande detonador foi verificar a morte das crianças. Tive vários apelos, antes mesmo de assumir o ministério, para tentar ver a situação do transporte aéreo [para remover pacientes a áreas com melhor infraestrutura de saúde]. Havia crianças que estavam em condições de muita fragilidade e que não conseguiam atendimento apropriado”, conta Trindade.
Nísia Trindade discursou a favor da ciência e dos direitos humanos em cerimônia de posse (Foto: Reprodução/Gov.br)
Nísia Trindade ainda deixa claro que enxerga o atual cenário como um fenômeno “multicausal”.
“Assumi há 21 dias e encontrei o funcionamento da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) muito pouco voltada para essas ações. Um exemplo é a casa que dá acolhimento aos indígenas em Boa Vista. Ficou evidente que ela está em más condições”, aponta. “O garimpo causa essa desorganização social e gerou problemas de segurança, dificultando o acesso das nossas equipes de saúde às regiões em que há doentes.”
Para a atual ministra da Saúde, a crise envolvendo os Yanomami e os outros povos indígenas é resultado de um governo anterior omisso, que também falhou em proteger esses povos tradicionais da pandemia de covid-19. “Eu vejo o abandono como uma forma de genocídio e essa população estava desassistida. O genocídio também pode ocorrer por omissão”.
Trindade está acompanhando a comitiva do presidente Luis Inácio Lula da Silva, que está na Argentina para participar da VII cúpula dos Chefes de Estado da Comunidade Estados Latinoamericanos e Caribenhos (Celac) e visitar o presidente vizinho Alberto Fernandez.
Foto Destaque: Visita do presidente Lula aos povos Yanomami. Reprodução/Ricardo Stuckert