Há exatos 136 anos, mais precisamente no dia 13 de maio de 1888, um documento que ficaria conhecido como Lei Áurea era assinado pela Princesa Isabel, filha do então imperador, Dom Pedro II, tratava-se da declaração do fim da escravidão no Brasil.
O processo de abolição foi um tanto moroso, por conta dos interesses que orbitavam o tema, não à toa, o Brasil foi o último país da América Latina a dar fim à escravidão institucionalizada. Ao longo dos anos, ficaram cada vez mais evidentes os indícios de que a Lei Áurea não se tratava de uma benevolência por parte do império. A abolição veio em decorrência da pressão externa, advinda principalmente da Inglaterra, dona de diversas colônias pelo mundo e pioneira no processo de liberação de escravos, mas não por motivos humanitários, e sim porque o fim do tráfico negreiro seria muito importante para a economia do país, abrindo o capital britânico para novas áreas de investimento.
Internamente, haviam outros fatores que indicavam uma eventual abolição, alguns não tão legítimos quanto foram descritos ao longo dos anos, a exemplo das leis abolicionistas, que apesar de serem consideradas por muitos como ineficientes, já apontavam um interesse no fim do trabalho escravo por parte da monarquia. A Lei Eusébio de Queirós (1850), que proibia o tráfico negreiro, só foi assinada por conta da pressão inglesa citada acima. Já a Lei dos Sexagenários (1871), libertava escravizados que tivessem 60 anos ou mais, isso sem considerar que a população escrava costumava falecer antes dos 50. E o que dizer da Lei do Ventre Livre (1885)? Que tornava livres os filhos recém-nascidos de escravizados mas não garantia a liberdade da mãe da criança.
Apesar da monarquia, havia quem se preocupasse, de fato, com o lado humano da questão, abolicionistas e intelectuais da época protagonizaram manifestações artísticas, debates parlamentares e até revoltas, os quais foram fundamentais para que fosse decretada a libertação dos negros das senzalas brasileiras.
Luís Gama
Negro, filho de mãe africana livre, participante da Revolta dos Malês, e pai branco, Luís Gonzaga Pinto da Gama nasceu livre, até que foi vendido por um amigo do pai enquanto viajava de Salvador ao Rio de Janeiro, onde desembarcou já escravizado. Luís foi alfabetizado por um estudante de direito aos seus 17 anos, e assim, cunhou sua própria carta de reivindicação de liberdade, que foi atendida.
Tornou-se rábula (advogado não diplomado) em São Paulo, onde ouvia aulas de direito às margens da Faculdade do Largo São Francisco. Já com certa competência adquirida, Luís passou a se dedicar a ajudar escravizados a conseguirem sua alforria, estima-se que tenha ajudado a libertar mais de 500 pessoas. Gama faleceu seis anos antes da abolição.
Maria Firmina dos Reis
Considerada a primeira escritora abolicionista, se tornou muito conhecida pelo seu livro, Úrsula, de 1859. A trama trazia a história de três personagens negros escravizados que passava para o leitor uma visão que questionava o sistema escravista predominante no Brasil. Maria Firmina demorou a ser reconhecida pela obra, já que à época assinou apenas como “Uma maranhense”. Maria também escreveu diversos poemas que denunciavam violências da escravidão no Maranhão.
André Rebouças
Baiano, de uma família negra, mas que circulava pela sociedade imperial, André se formou em engenharia realizou grandes trabalhos na área. Se atraiu pelas ideias abolicionistas e passou a se engajar na luta pela distribuição de terras para escravizados.
Ficou conhecido por dar um discurso na presença de Dom Pedro II e dizer coisas como “sou abolicionista de coração. Não me acusa a consciência ter deixado uma só ocasião de fazer propaganda para a abolição dos escravos, e espero em Deus não morrer sem ter dado ao meu país as mais exuberantes provas da minha dedicação à santa causa da emancipação”.
Lei Áurea (Foto: reprodução/Arquivo Nacional)
As consequências da abolição
Hoje, 136 anos depois, pode-se dizer que o processo de abolição da escravatura foi mera formalidade, onde o Brasil, como instituição, se declarava contrário ao trabalho escravo, porém, sem garantir aos recém-libertos, direitos básicos, como emprego, moradia e escolaridade. Ou seja, os negros alforriados continuaram vivendo à margem da sociedade brasileira, tendo sua cidadania cerceada.
A abolição não resolveu o problema da segregação racial do Brasil, ela apenas deu na mão dos libertos, um documento, mais nada. Por consequência, muitos buscaram abrigo em comunidades quilombolas, os que não tinham essa sorte, viravam moradores de rua, e outros até mesmo voltavam para as lavouras e engenhos, onde trabalhavam em troca de comida e moradia. O racismo é fruto do período escravocrata e ainda é muito presente na sociedade atual, além de que, ainda hoje, existem diversos casos de trabalho análogo à escravidão, outro fato que comprova a ineficiência da Lei Áurea. Tais questões apontam apenas que a abolição da escravatura no Brasil não se deu pelos motivos corretos, muito menos que se pensou nas consequências que ela poderia gerar.
Foto Destaque: A abolição da escravatura: quadro de 1849 de François-Auguste Biard. (Wikimedia Commons/Reprodução)