Se alguns séculos atrás as fundações da sociedade estavam sendo abaladas por indivíduos com “dinheiro novo” — que não foi herdado, mas geralmente conquistado através do comércio ou durante o surgimento das grandes indústrias —, parece que o dinheiro americano de atualidade está, em sua grande maioria, concentrado na geração antiga. Cerca de US$ 93 trilhões, que corresponde a dois terços do tesouro familiar norte-americano, está nas mãos dos “baby boomers”, pessoas que nasceram entre 1945 e 1964.
Grandes heranças e o governo americano
É esperado por analistas que cidadãos de classe-média venham a falecer após terem gastado grande parte de suas economias, não deixando herança para os familiares. Contudo, a enorme quantidade de ativos concentrada nas mãos dos americanos mais ricos certamente será herdada por filhos, netos, bisnetos, cônjuges ou outras pessoas de interesse, algo que é de grande interesse para o governo americano, cuja renda é composta por uma parte significativa de impostos arrecadados sobre heranças.
No papel, o governo americano impõe um severo imposto de 40% sobre heranças em território nacional, mas isso foi alterado ao longo de décadas de revisão na lei e outras políticas que diluíram o sistema. Como resultado, apenas 0,04% das heranças passam por algum tipo de tributação, em comparação com os 2,18% na virada do século. Um dos motivos para essa queda drástica são as mudanças anuais que o Congresso realiza. Por exemplo, nos anos 2000, casais podiam transferir apenas U$ 1,35 milhão em patrimônio para herdeiros sem imposto. Já em 2023, esse número subiu para US$ 26 milhões; um aumento significativo, mesmo se considerado o índice de inflação.
Mas esse número ainda pode não ser o bastante para os grandes bilionários, que possuem fortunas ainda mais vastas e expansivas. Como resultado, muitos acabam adotando certas estratégias para evitar os impostos.
Filantropia é uma das opções
Uma das estratégias que alguns bilionários adotam para evitar os impostos sem serem duramente criticados são as práticas filantrópicas. Andrew Carnegie — ex-bilionário americano que era a favor da taxação de grandes heranças —, doou cerca de 90% de seu patrimônio antes de falecer em 1919, um valor que hoje em dia seria equivalente a US$ 6 bilhões. Os outros 10% foram para uma organização sem fins lucrativos chamada Carnegie Corp.
Em 2016, a organização filantrópica Giving Pledge foi fundada por Warren Buffett em parceria com Bill Gates e sua esposa, Melinda. O objetivo da organização é criar uma rede de bilionários disposta a doar sua riqueza para causas filantrópicas, seja durante a vida ou após a morte. Até o momento, 104 bilionários americanos já fazem parte dessa organização, que conta com um patrimônio líquido de US$ 1,5 trilhão.
Opinião dos bilionários
Barry Diller, fundador do conglomerado de internet e mídia IAC, acredita que o código tributário norte-americano não é justo para com pessoas mais pobres. Ele é um dos 104 participantes do Giving Pledge, mas já afirmou que pretende deixar uma parte de seu dinheiro para os filhos. Apesar disso, o bilionário não se arrepende de ter usado ferramentas legais para conseguir pagar menos impostos. Segundo ele, “é necessário obedecer o código tributário. Se a lei permite que uma pessoa faça algo de determinada maneira, que indivíduo sensato agiria de outra forma?”.
Phil Knight, um dos fundadores da Nike, não acredita que o governo consiga usar o dinheiro dos impostos de maneira eficaz, preferindo acreditar em instituições de caridade. O bilionário já doou mais de U$ 3 bilhões para ações filantrópicas, em especial à Universidade de Oregon e a de Stanford.
Phill Knight, cofundador da Nike, com um patrimônio de US$ 40 bilhões (Foto: reprodução/Getty Images/Steve Dykes/Forbes)
Até mesmo Harold Hamm, um dos grandes magnatas do setor de petróleo e gás, não confia no governo americano para cuidar do dinheiro da população. Grande parte de suas doações até o momento, um montante de cerca de US$ 200 milhões, foram para a pesquisa sobre diabetes e institutos de energia.
Enquanto a evasão de taxas e outras práticas ilícitas por vezes praticadas pelos grandes bilionários e magnatas norte-americanos dificilmente seja razão de orgulho, é difícil negar que a doação para causas filantrópicas seja algo ruim.
Nesse ponto, a transferência de riqueza e o processo de herança pode se tornar um grande benefício aos americanos mais pobres, que carecem de dinheiro e da oportunidade para subir de vida.
Foto destaque: Barry Diller e Diane von Furstenberg, sua esposa, no tapete vermelho durante a celebração do Oscar de 2017 em Beverly Hills. Reprodução/Prensa Internacional/ZUMA Wire/Fox Business