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[Crítica] Premiado, “Baby” evidencia realidades e afetos em uma São Paulo invisível

Longa que passou por cerca de 50 festivais ao redor do mundo e recebeu mais de 25 prêmios, incluindo em Cannes, está em cartaz nos cinemas nacionais; confira nossa crítica

15 Jan 2025 - 20h35 | Atualizado em 15 Jan 2025 - 20h35
[Crítica] Premiado, “Baby” evidencia realidades e afetos em uma São Paulo invisível Lorena Bueri

“Na vida a gente tem que estar em movimento, senão o mundo vem e engole a gente.” – “Baby” (2024)

Será mesmo que não existe amor em SP? De volta a uma São Paulo marginal, Marcelo Caetano (“Corpo Elétrico”) nos leva ao epicentro de cotidianos tão reais, e ao mesmo tempo tão invisíveis, em uma cidade que abriga e destroi sonhos diariamente. No longa nacional mais premiado de 2024, “Baby”, somos guiados por uma trama que mistura uma realidade crua, com o afeto construído através das famílias que o destino se encarrega de nos apresentar, sob a óptica de corpos e vivências queer, em um filme que dificilmente vai sair de você.

Trama de “Baby”

Na trama, acompanhamos Wellington (João Mariano), um jovem que acaba de sair do sistema socioeducativo e se vê à deriva nas ruas do centro de São Paulo, sem conseguir qualquer contato com a família. Em suas andanças sem rumo, acaba conhecendo Ronaldo (Ricardo Teodoro), um garoto de programa mais velho e experiente, na casa dos 40 anos. Wellington, que adota o vulgo do título, Baby, entra na prostituição e venda de drogas junto com Ronaldo, que o abriga na pequena kitnet em que vivia e o ensina as manhas das ruas.


Assista ao trailer de "Baby" (Reprodução/YouTube/Vitrine Filmes)


Juntos, eles desenvolvem uma relação complexa, que transita entre uma proteção quase paternal, exploração e uma clara atração sexual. Em Ronaldo, Baby vê uma âncora, e uma família, principalmente ao ser introduzido em seu seio familiar, conhecendo seu filho, a mãe do menino, Priscila (Ana Flávia Cavalcanti) e a esposa dela, Jana (Bruna Linzmeyer), se sentindo pertencente como há tempos não sentia.

O filme foca na dinâmica turbulenta e sensual entre os dois e suas tentativas arriscadas de sobrevivência, evidenciando também a cena ballroom como uma arte de resistência na comunidade LGBTQIAPN+, transformando a capital paulista em um personagem intrinsecamente ligado com as formas de agir de cada persona retratada. Em “Baby”, que tem “Foi Mal”, de Urias, como trilha sonora, Marcelo Caetano se apossa da letra: “tentando meu melhor, eu te mostrei o pior de mim”, para mostrar que aqueles que nos amam também podem nos fazer mal.

Atuações viscerais e acolhedoras

Parte da conexão instantânea que “Baby” finca com o público vem não só da direção e roteiro de Marcelo, e as impecáveis fotografia de Joana Luz e Pedro Sotero e direção de arte de Thales Junqueira – que falaremos mais a frente – mas sim, e principalmente, pelas performances visceralmente acolhedoras dos premiados atores, João Mariano e Ricardo Teodoro.

É através daqueles corpos tão reativos e humanos que Baby e Ronaldo desabrocham na tela com todas as suas camadas, seu peso e sua delicadeza. Seus olhares tão transparentes nos revelam coisas que muitas vezes nem são oralmente ditas, mas que estão ali, nas entrelinhas, em um subtexto potente, sobrevoando naquela névoa vermelha entre o amor e a dificuldade de amar, nos lembrando de todos os amores que quase foram, mas que o mundo, hostil, não deixou serem.


Baby e Ronaldo em cena de "Baby" (Foto: Joana Luz/divulgação/Primeiro Plano)


Com um trabalho de elenco ainda mais maduro que em “Corpo Elétrico”, Caetano guia uma química muito natural e íntima entre os protagonistas. A relação conflituosa e dúbia dos dois se torna tangível ao público, transcendendo uma superfície puramente física e sexual, desembocando em algo psicológico e emocional, em que ambos são dependentes um do outro, se repelindo e atraindo por vezes, como um imã, compartilhando das mesmas inseguranças e angústias, cercados por um cenário que ameaça os engolir em qualquer demonstração de fraqueza. É hipnotizante acompanhá-los tão à vontade em cena, e pensar: por quantos Wellingtons e Ronaldos, invisíveis, passamos diariamente? “Baby” é transformador.

A construção de uma São Paulo dúbia

“Baby” é de escolhas e construções técnicas e estéticas muito perspicazes para criar ambientes dualistas que transmitem acolhimento, pertencimento, opressão e hostilidade ao mesmo tempo. De cores quentes e saturadas, em equilíbrio com tons frios e escuros, evidenciando, nas ruas, o perigo iminente e a vida noturna, e nos ambientes fechados, a luxúria e a pobreza. O êxito vem justamente do olhar de Caetano, e as elogiosas fotografia de Joana Luz e Pedro Sotero e direção de arte de Thales Junqueira.


João Mariano e Ricardo Teodoro como Baby e Ronaldo (Foto: reprodução/Primeiro Plano)


O longa, entre outros locais, se passa majoritariamente em três: a kitnet que Baby e Ronaldo dividem, a casa de Priscila e Jana e as ruas do centro, sendo muito específicos com o que querem fazer sentir em casa um dos ambientes. Na moradia dos protagonistas, há uma certa claustrofobia, e também proteção. Sempre bagunçada, cores opacas, paredes descascando, mas com detalhes que se destacam, como vermelho e rosa nas roupas de cama, amarelo na cortina do banheiro, e espelhos pelo local. Ela ilustra bem a relação dos dois: tumultuada e aconchegante.


Casa de Priscila e Jana (Foto: reprodução/Primeiro Plano)


Já a casa da família de Ronaldo, é predominada por uma varanda que deixa a luz do sol entrar, é organizada e tem tons quentes e amarelados. Ali é onde ambos encontram refúgio da brutalidade exterior. Aquela casa é uma das personificações de família que “Baby” nos revela.

O centro de São Paulo, a “melhor cidade da América do Sul”, como Gal Costa ilustra na música homônima ao título do filme, são dois personagens diferentes durante o dia e a noite. Dominada por planos abertos pela manhã, retratando as rotinas de trabalho arriscadas dos dois, ela se mostra repressora e ao mesmo tempo, os torna invisíveis, marginais e…invisíveis. À noite, São Paulo é iluminada e sombria, respirando arte e sobrevivência. É nesse cenário em que vemos o ballroom acontecer, boates com luzes piscantes e a sensação interminável de perigo e liberdade. “Baby” é essa mistura harmônica de extremos, que te acolhe e te sufoca da maneira que somente um bom, e inesquecível, filme é capaz de fazer.

Nota: ★★★★★

Foto destaque: Pôster de "Baby" (Divulgação/Primeiro Plano/Aline Arruda)

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