Ronaldo Fraga retorna ao SPFW em cortejo poético a Milton Nascimento
Estilista retorna ao SPFW após seis anos com Minas-Nascimento; a coleção celebra o cantor Milton Nascimento e mostra um cortejo de afeto e poesia

Seis anos depois de sua última participação, Ronaldo Fraga voltou às passarelas do São Paulo Fashion Week como quem regressa a um altar. A escolha do cenário — o Museu da Língua Portuguesa e não poderia ser mais simbólica: entre palavras e memórias, o estilista mineiro apresentou a coleção “Minas-Nascimento”, uma homenagem luminosa a Milton Nascimento.
Fraga transformou o desfile em um rito de celebração. Crianças abriram o caminho vestidas como anjos, em uma cena que remetia tanto à pureza quanto à origem da própria música de Milton. Aquele menino de cinco anos que, com uma sanfona nas mãos, começou a traduzir o som dos rios, dos ventos e das montanhas de Minas. A passarela virou procissão: modelos desfilaram com luzes de LED sobre a cabeça, como se carregassem pequenas auréolas em movimento.
O som que vira tecido
A trilha sonora foi tão protagonista quanto as roupas. Vozes, sanfonas e batidas suaves ecoaram pelo museu, costurando o tempo entre o menino de Três Pontas e o estilista de Belo Horizonte. Em cada passagem, o público parecia caminhar com Fraga — não apenas assistindo a um desfile, mas participando de um cortejo de memória e emoção.
Coleção "Minas-Nascimento" de Ronaldo Fraga (Vídeo: reprodução/YouTube/@SPFWoficial)
Essa atmosfera imersiva reforçou a força simbólica da coleção: vestir-se, aqui, é também um ato de ouvir. A música de Milton virou textura, e as texturas de Fraga ganharam som em uma fusão rara entre moda, arte e afeto.
Entre o minério e o sonho: o artesanato como voz
A coleção nasceu das mesmas terras que moldaram tanto o estilista quanto o músico. Linho cru, jeans e tafetá apareceram tingidos em tons terrosos, dourados e azuis profundos; um reflexo do minério, do céu e das noites mineiras. Cada ponto de bordado, cada renda richelieu, cada pedaço de crochê trazia a assinatura silenciosa de artesãs de Minas Gerais, Goiás e Santa Catarina.
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Coleção "Minas-Nascimento" de Ronaldo Fraga (Vídeo: reprodução/Instagram/@revistazelo)
As peças carregavam versos bordados, fragmentos de canções como “Caçador de mim” e mangas volumosas que davam corpo ao gesto, ampliando o discurso visual de Fraga. A silhueta curta e ampla, característica do estilista, reafirmou o equilíbrio entre o dramático e o cotidiano, entre o vestir e o sentir.
Mais do que roupas, “Minas-Nascimento” é um reencontro entre fé, memória e pertencimento. Ronaldo Fraga costura o Brasil com linhas de afeto e resistência, transformando tecido em canção. “Com voz também se costura”, ele lembra e, na noite em que Milton Nascimento virou roupa, o SPFW voltou a soar como poesia.